O que está por trás da ligação de Musk e Lemann. Por Luis F. Miguel

Os empresários Elon Musk e Jorge Paulo Lemann. Foto: Reprodução

Por Luis Felipe Miguel

Elon Musk decidiu partir para o ataque. Está ameaçando descumprir decisões da justiça brasileira relativas ao Twitter (que só ele chama de “X”).

Diz que vai perder dinheiro mas que “princípios” são mais importantes.

A gente finge que acredita. Como as outras vozes da extrema-direita da qual Musk se tornou corifeu, há muita conversa sobre princípios, mas procurando um pouco se acha a motivação real: grana.

O jornalista Luís Nassif juntou os pontos. Os agentes da Fundação Lemann no MEC montaram um edital relativo à informatização das escolas com exigências aleatórias que só a Starlink, de Musk, poderia atender.

Lemann, o saqueador das Lojas Americanas e líder, como disse Nassif, de um curioso grupo de bilionários que entram “apenas com indicações, não com dinheiro”, está interessado em fazer negócios com Musk. Por isso o agrado.

Mas o esquema vazou e o MEC retificou o edital, eliminando a pegadinha que beneficiava a Starlink. Por isso Musk está bravo e resolveu revidar.

A única dúvida é se os ataques foram combinados com o bolsonarismo ou se (o que é mais provável) o bilionário decidiu por conta própria sabendo que a extrema-direita local acompanharia de ouvido.

A reação de Musk é mais um dos riscos gerados pelo fato de que organizações monopolísticas, privadas, estrangeiras e com ânimo de lucro se tornaram a grande arena em que o debate público ocorre.

O bilionário nascido na África do Sul se singulariza por seu jeito destemperado e modos de criança mimada. Participa de reuniões de negócios intoxicado, responde tuítes com emoji de cocô, é adepto de bravatas, traumatiza seus filhos ao batizá-los de forma bizarra (“X Æ A-12”, “Exa Dark Sideræl”, “Techno Mechanicus Tau”). Mas Mark Zuckerberg e Larry Page, para citar apenas dois exemplos, são igualmente predatórios e danosos à democracia.

Musk atacou Alexandre de Moraes, do STF, no X (ex-Twitter). Foto: Reprodução

As plataformas sociodigitais são experimentos de modulação de comportamento em massa. As consequências em termos de qualidade do debate público, segurança e saúde mental (sobretudo de crianças e jovens), sustentabilidade ambiental ou preservação de direitos não importam – o que elas desejam é lucro e poder.

A doutrina liberal da liberdade de expressão, que ainda hoje funda muitas de nossas expectativas, incluía dois pressupostos que hoje estão erodidos.

O primeiro é que seria possível operar como se, em regra, os falantes agissem de boa fé. Isso não é mais sustentável num ambiente de mentiras deslavadas disseminadas em ritmo industrial.

O segundo é que o debate aberto promoveria a vitória das posições mais sólidas, melhor embasadas, com maior aderência à realidade.

Por isso, muito da crítica ao velho sistema da mídia corporativa apontava na direção de ampliar a pluralidade de vozes, a fim de que os diversos interesses sociais disputassem com maior condição de igualdade na esfera pública.

A comunicação guetificada das plataformas, com suas “bolhas” independentes, muda por completo a situação.

É necessário ter critérios o mais claros possíveis sobre a linha divisória entre conteúdos legítimos e ilegítimos. A solução não é deixar tudo ao arbítrio de Alexandre de Moraes – nem, muito menos, de Musk ou Zuckerberg.

Mas não basta isso. É preciso também regular o funcionamento dos algoritmos e regular o modelo de negócios das plataformas, a fim de reduzir seu império sobre os usuários.

Não é só a mentira que ameaça a democracia. O controle sobre os comportamentos também. Sem cidadãos autônomos, ela não é capaz de sobreviver.

Publicado originalmente no Facebook do autor

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