Pesquisa A preservação do patrimônio arqueológico e a importância de um acompanhamento adequado A descoberta e a preservação de sítios arqueológicos em áreas urbanas são fundamentais para compreender a história das populações e o processo de formação das cidades

Vinícius Franco durante a realização de catalogação de Cerâmicas Tupi | Foto: divulgação

O crescimento das áreas urbanas no Brasil levanta uma preocupação crescente sobre a preservação da história das populações e das próprias cidades, especialmente quando não há um acompanhamento arqueológico adequado. No Ceará, particularmente em Fortaleza e na Região Metropolitana, apesar de evidências históricas que apontam para uma densa ocupação indígena do território antes da chegada dos europeus no século XVII, muito do patrimônio arqueológico local pode estar sendo negligenciado.

Vinícius Franco, doutorando e mestre em Arqueologia pelo Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), especialista em Cultura Material e Arqueologia, alerta para o risco de perda desse patrimônio. Embora obras de médio e grande porte sigam a legislação ambiental, com medidas de prevenção ao patrimônio arqueológico, muitas pequenas construções, como projetos de infraestrutura (saneamento básico, energia), condomínios, shoppings e estradas, continuam sem o devido acompanhamento. Mesmo sem causar impactos ambientais tão expressivos, essas obras podem causar danos irreversíveis aos bens culturais.

“Essas intervenções, licenciadas pelas prefeituras, frequentemente desconsideram leis federais de proteção ao patrimônio cultural. Isso representa um grave risco de deixarmos de identificar e documentar novos sítios arqueológicos que ainda podem ser desconhecidos em vários locais da cidade”, alerta Vinícius.

De acordo com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), o Ceará possui 1.323 sítios arqueológicos registrados. Somente nas cidades de Fortaleza, Caucaia e Eusébio, há pelo menos 61 sítios, que incluem tanto sítios pré-coloniais quanto históricos, como o Cemitério São Casimiro e o Farol do Mucuripe. Recentemente, as obras da Linha Leste do Metrô em Fortaleza revelaram o sítio arqueológico Estação Chico da Silva, com uma impressionante coleção de artefatos.

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Exemplos de boas práticas em outras cidades

Vinícius Franco destaca exemplos de boas práticas na gestão do patrimônio arqueológico em outras cidades do Brasil. No Rio de Janeiro, o Cais do Valongo, descoberto em 2011, é hoje um sítio arqueológico reconhecido pela UNESCO. Em São Luís (MA), escavações recentes revelaram 43 esqueletos e mais de 100 mil peças arqueológicas, com ocupações datadas de até 10 mil anos.

O pesquisador também cita São Paulo como referência em integrar a preservação arqueológica com o desenvolvimento urbano. Na cidade paulista, o IPHAN e a Secretaria de Meio Ambiente exigem pesquisas arqueológicas preventivas, independentemente do porte das obras, o que resultou em descobertas como o Quilombo Saracura, resgatando mais de 20 mil itens históricos durante a construção da Linha Laranja do Metrô. Além disso, o Centro de Arqueologia de São Paulo (CASP) atua como um espaço de preservação e reflexão sobre o patrimônio arqueológico local.

Fortaleza: desafios e necessidade de políticas públicas eficazes

Em contraste, Vinícius Franco aponta que Fortaleza ainda carece de políticas públicas eficazes para garantir a preservação de seu patrimônio arqueológico. “A Secretaria Municipal de Urbanismo e Meio Ambiente (SEUMA), por exemplo, emite licenças ambientais sem exigir estudos arqueológicos prévios, o que é uma falha significativa”, afirma o arqueólogo. Segundo ele, o modelo de São Paulo demonstra que é possível conciliar desenvolvimento urbano com a proteção do patrimônio cultural, algo que Fortaleza ainda precisa adotar para preservar sua história e as heranças culturais de seus primeiros habitantes.

O papel do Instituto Tembetá na preservação do patrimônio cearense

Vinicius Franco durante visita ao Instituto Tembetá | Foto: Lohan Costa

Há dez anos, o Instituto de Arqueologia e Patrimônio Cultural do Ceará (Instituto Tembetá) tem desempenhado um papel fundamental na preservação do patrimônio cultural do estado. Fundado em 2014, o Instituto é reconhecido pelo Centro Nacional de Arqueologia (CNA) do IPHAN e tem se dedicado à proteção do patrimônio histórico, arqueológico e ambiental cearense. Sua atuação abrange desde projetos de infraestrutura e mobilidade urbana, como o Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) e o Metrô de Fortaleza, até a restauração de patrimônios históricos como o Teatro Francisca Clotilde, em Aracati, e a Casa de José de Alencar, em Fortaleza.

“Nosso trabalho vai além da arqueologia, buscamos construir pontes entre o passado, o presente e o futuro, conectando as comunidades às suas raízes culturais”, destaca Vinícius Franco, que também é responsável pela direção do Instituto Tembetá. O Instituto tem se consolidado como referência, com mais de 300 mil peças em seu acervo, incluindo artefatos do período pré-colonial e materiais históricos, como louças inglesas do século XIX e urnas funerárias.

Além de apoiar mais de 200 empreendimentos licenciados, o Tembetá tem investido na divulgação científica e no apoio a pesquisas acadêmicas, atingindo milhares de pessoas nas redes sociais e promovendo a conscientização sobre o patrimônio arqueológico cearense.

Instituto Tembetá | Foto: Mateus Monteiro

Sobre Vinícius Franco

Vinícius Franco é um pesquisador cearense com ampla formação acadêmica e experiência cultural. Doutorando e mestre em Arqueologia pelo Museu Nacional da UFRJ, é graduado em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Ceará (UFC) e especialista em Cultura Material e Arqueologia pela Universidade de Passo Fundo (UPF). Seu trabalho acadêmico e cultural abrange áreas como patrimônio, memória, identidade e preservação, com uma vasta trajetória no setor cultural e em projetos de preservação e divulgação do patrimônio histórico e arqueológico cearense.

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