Primeira década da obra de Joel Zito Araújo é revisitada em mostra

“Joel Zito Araújo: Uma Década em Vídeo” tem início nesta quarta, 24 de abril, e segue até 3 de maio, em três espaços da cidade

Patrícia Cassese | Editora Assistente

A partir desta quarta-feira, 24 de abril, três espaços culturais de Belo Horizonte passam a receber a mostra “Joel Zito Araújo: Uma Década em Vídeo”, que, como o próprio nome se debruça sobre a produção de um dos mais importantes cineastas brasileiros contemporâneos. No entanto, a iniciativa, que se estende até o dia 3 de maio, traz um recorte particular: a primeira década de produção audiovisual do mineiro (de Nanuque).

Com curadoria e realização dos cineastas Álvaro Andrade e Vinícius Andrade, a mostra está dividida em três campos temáticos: “Vanguarda das Lutas: Mulheres Negras na Conquista de Direitos”, “Movimentos Negros: Faces de uma Luta Coletiva” e “Das Fábricas às Ruas: Memória e Atualidade das Lutas Trabalhistas no Brasil”.

Roda de conversa

Primeiramente, as sessões terão vez no Centro Cultural Vila Santa Rita, nos dias 24 e 25 de abril, a partir das 17h30. Na sequência, no Cine Santa Tereza, de 26 a 28 de abril, com aula magna de Joel Zito Araújo em 26 de abril, às 19h, e presença de intérprete de libras. A roda de conversa traz o grupo de pesquisa Poéticas da Experiência. Na data, será lançado o catálogo da mostra. Por fim, no Centro Cultural Zilah Sposito, nos dias 2 e 3 de maio. Cereja do bolo: toda a programação é gratuita.

Oe projeto é realizado com recursos da Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Belo Horizonte, por meio do Edital BH nas Telas, na modalidade Fundo. Todas as sessões da mostra serão comentadas e terão, como debatedores, os pesquisadores Ewerton Belico, Alessandra Brito, Nicole Batista e Edinho Vieira.

Para falar mais sobre a homenagem, a reportagem do Culturadoria conversou com Joel Zito Araújo. Confira, a seguir, alguns trechos.

Recorte da mostra

Joel Zito Araújo conta que foi “um choque agradável”, o de ter encontrado pessoas com a iniciativa de reorganizar o que ele produziu no recorte proposto. “Ou seja, não só exibir, como também buscar os meus parceiros da época, colher opiniões sobre o processo… Enfim, foi muito importante, até mesmo porque estou num período de muita atividade. Na verdade, a partir do momento em que fui me tornado mais conhecido e respeitado, foram aumentando as minhas chances de fazer cinema. Então, nos últimos dez anos, trabalhando em um filme atrás do outro”.

O cineasta quer dizer que, por conta da agenda lotada, não tem tido tempo para cuidar da organização da própria produção. “Tenho cada vez mais ficado distante de, como diria, um certo cuidado com a minha memória, com aquilo que eu produzi nesta primeira fase. Então, essa iniciativa foi muito bem-vinda, muito importante. Aliás, eles encontraram inclusive filmes que eu não tinha mais, que estava em outros lugares. Ou seja, foi super bacana. Estou muito agradecido com os curadores dessa mostra”.

Denominador comum

Perguntado se percebe algum denominador comum entre os filmes selecionados para a mostra “Uma Década em Vídeo”, Joel Zito Araújo responde: “Bem, o que acho que existe de muito forte é o meu enorme laço com os movimentos sociais brasileiros. Inicialmente, com o movimento sindical”. Assim, lembra o cineasta, as primeiras obras de sua trajetória estão muito coladas ao movimento sindical, especialmente “Os Nossos Bravos” (1987) e “Memórias de Classe” (1989). “Mas com ‘Os Nossos Bravos’, eu começo a entender a importância de produzir filmes, vídeos, na temática racial, do racismo brasileiro”, conta.

Temática racial

Assim, num segundo momento, o próprio Joel Zito se viu mais “colado” ao movimento negro. “Veja, eu nunca me declarei como parte do movimento negro. Porque, efetivamente, eu nunca fui. Eu nunca integrei o Movimento Negro Unificado, o MNU, ou outras organizações. Eu fui sempre um grande companheiro de jornada. E isso me permitiu grandes amizades, grandes parcerias”.

Joel Zito cita, por exemplo, na Bahia, “o pessoal do Olodum, do Ilê Ayê”. “Assim como, em São Paulo, o Geledés e o Centro de Estudo das Relações de Trabalho e Desigualdades, e por aí afora. Quer dizer, eu fui tendo vários parceiros importantes nesses primeiros dez anos, que me fizeram a cabeça, que me ajudaram na minha formação. E nessa segunda, eu fui mergulhando cada vez mais nas questões raciais. E a partir dessa minha escuta, do que era demandado, do que precisava refletir. Daí, fui produzindo”.

“Eu, Mulher negra”

Nesse segundo momento, Joel Zito entende que o trabalho dele atende a muitas especificidades do presente. “Por exemplo, eu tenho um trabalho que vejo que tem um certo ineditismo na discussão na questão da mulher negra, que se chama ‘Eu, Mulher Negra’ (1994), produzido em parceria com o Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (CEBRAP). A ideia foi um desdobramento do projeto “Saúde Reprodutiva da Mulher Negra”, coordenado por (pela mineira) Elza Salvatori Berquó, “uma grande geógrafa”.

Assim, Zito lembra que o trabalho, ao mesmo tempo que fala sobre a mulher negra, sobre a saúde da mulher negra, também aborda outros temas, como os orixás. “E ele é narrado poeticamente por um personagem interpretado pela Ruth de Sousa. Aliás, foi aí, inclusive, que conheci a Ruth, que me torno amigo dela, que começa a surgir a ideia de ‘A Negação do Brasil’ (2000) e, principalmente, de ‘As Filhas do Vento’ (2005)”.

“A Exceção e a Regra”

Pouco depois, Joel Zito Araújo faz outro filme que ele também entende como relevante nesse período do recorte da mostra, que foi “A Exceção e a Regra” (1997). “É um filme que tem um elemento observacional muito forte, ao acompanhar a luta de um trabalhador negro, num momento de resistência dele, ao ser vítima de racismo”.

Neste filme, prossegue Joel, há um momento de encenação. “Ou seja, que não é típico do cinema direto. Mas sim, ele tem muito também de cinema direto, na verdade, eu gosto muito desse filme. Enfim, todos esses trabalhos desse período têm como fio condutor essa minha proximidade com os movimentos sociais. Primeiramente com o movimento sindical, depois, com o movimento negro. Inclusive, acompanhando as ondas dentro do movimento negro, especialmente essa emergência da luta das mulheres negras”.

Nanuque

Joel Zito Araújo confessa que se sente particularmente feliz com a itinerância da mostra pelo interior de Minas. “Inclusive pela região em que eu nasci, óbvio. Acho que o sonho da grande maioria dos artistas é ser reconhecido pelo seu próprio povo, pelos seus conterrâneos, pelas pessoas da sua terra, pelas pessoas da sua cultura. Assim, fico agradecido por essa oportunidade”.

Serviço

MOSTRA JOEL ZITO ARAÚJO: UMA DÉCADA EM VÍDEO

Datas, locais e horários:

24 e 25 de abril | Centro Cultural Vila Santa Rita | Rua Ana Rafael dos Santos, 149 – Vila Santa Rita
26 a 28 de abril | MIS Cine Santa Tereza | Rua Estrela do Sul, 89 – Santa Tereza
02 e 03 de maio | Centro Cultural Zilah Spósito | Rua Carnaúba, 286 – Zilah Sposito

Entrada gratuita

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