Conheça documentário sobre última turnê de Milton Nascimento que estreou na Mostra de Cinema de Tiradentes

documentário milton nascimento

documentário milton nascimento
Mostra de Cinema de Tiradentes sediou a estreia do filme ‘Milton Bituca Nascimento’ (Foto: Leo Lara/ Universo Produção)

Durante 2022, Milton Nascimento fez “A última turnê da música”. Aos 80 anos, passou por diversas cidades europeias, norte-americanas e brasileiras com uma seleção de canções que marcaram a sua trajetória. Na última apresentação, no Mineirão, em Belo Horizonte, o músico reencontrou seus parceiros do Clube da Esquina e se emocionou ao deixar os palcos, cercado de família e amigos, sabendo que aquela poderia ser a última oportunidade de encontrar ao vivo tantos fãs. Foram 60 mil pessoas emocionadas com a voz etérea do artista. O documentário “Milton Bituca Nascimento”, de Flávia Moraes, é fruto do trabalho que a diretora teve em acompanhar o artista durante toda essa jornada, registrando os shows, os bastidores e os depoimentos de outros artistas sobre a força de Milton. A estreia mundial aconteceu na Mostra de Cinema de Tiradentes, e a Tribuna esteve na sessão para registrar as primeiras impressões sobre o filme que chega aos cinemas em 20 de março.

A primeira exibição do longa estava marcada para o domingo (26), no Cine-Praça, mas não pôde ser realizada por conta da chuva, e foi transferida para o Cine-Teatro, uma sala bem menor. O público, ávido para assistir ao filme, com certeza um dos mais aguardados da mostra, ficou insatisfeito. Por isso, a organização deu um jeito de marcar outra exibição, na segunda-feira (27), no espaço aberto, e reuniu uma plateia com muita vontade de conhecer a obra. A narração de Fernanda Montenegro dá o pontapé do filme, que mostra os preparativos para o primeiro show da turnê, intercalando essas imagens com uma encenação de Milton criança desenhando os trenzinhos e montanhas da capa de “Geraes” – imagem essa que vai se repetir no longa, e que serve para marcar justamente este retorno, no último show da turnê, no Mineirão (o único show no Brasil que aparece no documentário).

Logo em seguida, começam os depoimentos que costuram o longa. Esses relatos incluem Quincy Jones, Spike Lee, Paul Simon, Caetano Veloso, Chico Buarque, Gilberto Gil, Mano Brown, Esperanza Spalding, Simone e Maria Gadú, para citar alguns. Os artistas falam sobre o primeiro encontro com a obra de Milton, a importância do artista em suas vidas, as intervenções que foram vendo ele fazer na música e, também, a reação do público. A equipe que trabalha diretamente com Milton também aparece, introduzindo o público no gosto pelo caos do qual o artista parece gostar, sem ter a necessidade de explicar muito o que os outros musicistas devem fazer. O que ele gosta, como apontam os relatos, é de deixar que cada um faça o que faz de melhor do seu jeito.

Milton Nascimento tem fama de não ser muito chegado a entrevistas. Na obra, ele mesmo conta que não é de falar muita coisa. As estratégias da diretora para driblar isso e construir uma maior intimidade do público com o cantor são variadas, e incluem principalmente imagens dele sentado na cama, em um quarto, e conversando sem olhar diretamente para a câmera; e um único momento mais íntimo, do artista conversando com seu filho e produtor do documentário, Augusto, sobre a própria história, e também o questionando sobre o que sente sendo seu filho. Também há um dos planos mais bonitos do longa, em que ele entra em uma igreja e, sentado, o sol bate diretamente no artista, mostrando essa iluminação que emana. 

Assista ao trailer do documentário ‘Milton Bituca Nascimento’

documentário milton nascimento
Em praça lotada, público pôde acompanhar, pelo documentário, os bastidores da última turnê de Milton Nascimento (Foto: Leo Lara/ Universo Produção)

Como explicar o inexplicável

Mas muito tempo do documentário se dedica a tentar entender o que é o fenômeno Milton Nascimento. No que consiste a emoção que sai de sua voz, como uma nota de música, impossível de replicar, ou mesmo a qual gênero musical ele pertence. Alguns acreditam que seja o jazz, outros a música popular brasileira, outros uma terceira coisa, uma capacidade que só o artista tem. As respostas para esse fenômeno tentam ser colocadas em palavras por muitos artistas norte-americanos e europeus – que são o foco quase na primeira metade do filme inteira, falando sobre o que sentem com a música do artista, mesmo sem entender o idioma português. Também refletem sobre o assunto alguns brasileiros de sua geração (os membros do Clube da Esquina, que aparecem na obra, só são citados depois de cerca de 1h30 de filme) e das gerações seguintes, que também foram influenciadas pela sua obra. Não encontram resposta, é claro: como explicar o inexplicável?  

Ao tentar encontrar uma explicação racional, o filme parece se esquecer de deixar essa força se mostrar sozinha. De deixar a voz de Milton ecoar por mais tempo, da gente ver o artista na tela como o protagonista que é. São muitos depoimentos entrecortados, o que acaba por transmitir uma pressa que compromete o contato com o impacto de cada um deles. O impacto que o artista tem, ao subir aos palcos, é pouco explorada, ainda mais considerando os registros que se tem desses shows, em que também o seu canto de artista se altera, mostrando o peso da idade – com toda a beleza que essa força do tempo sob um dos grandes brasileiros pode ter, mostrando como ele consegue dizer adeus de uma forma que só ele é capaz. Essa emoção da despedida aparece menos do que deveria no filme, ainda que ele tenha se proposto justamente a acompanhar uma última turnê.

Despedida que não é despedida

Com um fim que é também um retorno ao começo, o documentário se encerra com imagens bonitas de Milton e desse ciclo da vida, do impulso que a voz do artista tem para levá-lo sempre em frente. A validação de outros artistas, neste momento, parece menos importante perto dessa capacidade de atravessar o tempo, o espaço e até mesmo a lógica. É como pensar que a Fernanda Torres precisa do Oscar para ser considerada uma ótima atriz. Eles (Milton e Fernanda) independem de certificações externas; é bom quando recebem, mas independentemente disso já são parte muito central de uma história que é nossa. 

Em certo momento da obra, Milton afirma: “Estou feliz”. Isso acalenta o coração de qualquer fã, que nota que o artista percebe a sua própria trajetória como ninguém. E, pela forma que Flávia Moraes constrói esses momentos, também dá pra ver: o filme não fala apenas sobre uma despedida porque, afinal, o fim não chegou, talvez nunca chegue. Desde a turnê, Milton gravou com Esperanza Spalding, segue a caminho do Grammy pela colaboração com a artista (o que fez com que não pudesse estar na exibição, inclusive), sua trajetória ainda vai virar série ficcional, já fez participações em shows de amigos, apareceu em especiais na TV e outros projetos se apresentam. Não é adeus, é travessia.

*A repórter viajou a convite da Universo Produção

O post Conheça documentário sobre última turnê de Milton Nascimento que estreou na Mostra de Cinema de Tiradentes apareceu primeiro em Tribuna de Minas.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.