Como atuava a cúpula da suposta trama golpista, segundo denúncia da PGR

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outras 33 pessoas foram denunciadas nesta terça-feira (18) pela Procuradoria-Geral da República (PGR) pelos crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, organização criminosa, dano qualificado pela violência e grave ameaça, além de deterioração de patrimônio tombado. Se condenados, os acusados podem pegar até 34 anos de prisão.

A denúncia, baseada no relatório da Polícia Federal (PF), aponta Bolsonaro como líder de um grupo que atuou para impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) após as eleições de 2022. Segundo os investigadores, a organização criminosa era altamente estruturada e operava por meio de seis núcleos com funções específicas:

  • Núcleo de Desinformação e Ataques ao Sistema Eleitoral
  • Núcleo de Incitação Militar
  • Núcleo Jurídico
  • Núcleo Operacional de Apoio às Ações Golpistas
  • Núcleo de Inteligência Paralela
  • Núcleo de Oficiais de Alta Patente e Apoio

A PGR decidiu fatiar as acusações, apresentando cinco denúncias separadas contra diferentes grupos dentro da organização. Bolsonaro foi denunciado ao lado dos ex-ministros Braga Netto (Casa Civil), Paulo Sérgio Nogueira (Defesa), Anderson Torres (Justiça) e Augusto Heleno (GSI), além do ex-diretor-geral da Abin, Alexandre Ramagem, e do ex-comandante da Marinha, Almir Garnier.

Plano de golpe

Conforme a acusação, desde 2021 Bolsonaro e seus aliados começaram a criar um ambiente de desconfiança em relação ao sistema eleitoral, promovendo ataques sistemáticos ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e às urnas eletrônicas.

Segundo os investigadores, esse discurso foi usado para preparar o terreno para uma ruptura institucional caso o resultado das eleições de 2022 fosse desfavorável ao então presidente.

O documento revela que, em março de 2021, integrantes do núcleo central da organização cogitaram a possibilidade de Bolsonaro desobedecer ordens do Supremo Tribunal Federal (STF) e prepararam um plano de contingência para que o ex-presidente fugisse do país caso houvesse reação das Forças Armadas.

As investigações identificaram manuscritos, planilhas e mensagens que comprovam a intenção de criar um discurso permanente sobre supostas fraudes nas urnas eletrônicas. A estratégia previa a repetição contínua dessas alegações para deslegitimar o resultado eleitoral e preparar a militância bolsonarista para uma eventual tentativa de golpe.

Em julho de 2021, Bolsonaro fez uma transmissão ao vivo, diretamente do Palácio do Planalto, reforçando suspeitas infundadas sobre o sistema eleitoral e exaltando o papel das Forças Armadas. A partir desse momento, conforme a denúncia, seu discurso se tornou mais agressivo, estimulando a indignação de seus apoiadores e preparando o caminho para uma ação mais direta contra as instituições.

Estrategistas do golpe

Segundo a PGR, o núcleo central do grupo tentou cooptar membros das Forças Armadas para aderirem ao plano golpista. Um dos principais momentos dessa articulação ocorreu em julho de 2022, durante uma reunião ministerial em que Bolsonaro e seus aliados discutiram estratégias para impedir a posse de Lula.

O inquérito destaca uma fala de um dos generais denunciados, que afirmou: “O que tiver que ser feito tem que ser feito antes das eleições. Se tiver que dar soco na mesa, é antes das eleições. Se tiver que virar a mesa, é antes das eleições.”

Os investigadores também apontam que o plano incluía a prisão de ministros do STF e do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Inicialmente, a minuta golpista previa a inclusão de Gilmar Mendes entre os alvos, mas Bolsonaro teria solicitado a retirada do nome do ministro, mantendo apenas Alexandre de Moraes.

“As investigações revelaram uma aterradora operação de execução do golpe, em que se admitia até mesmo a morte do Presidente da República e do Vice-Presidente da República eleitos, bem como a de ministros do Supremo Tribunal Federal”, cita o relatório da PGR.

Além da cooptação militar, a denúncia menciona tentativas de interferência nas eleições. Durante o segundo turno, o grupo utilizou a Polícia Rodoviária Federal (PRF) para dificultar o acesso de eleitores nordestinos às urnas, em uma ação que mirava principalmente eleitores do candidato petista.

A denúncia também cita a reunião de 18 de julho de 2022, na qual Bolsonaro convocou embaixadores para disseminar falsas acusações de fraudes nas urnas. Segundo a PGR, esse encontro teve o objetivo de preparar a comunidade internacional para justificar um eventual golpe de Estado.

Ruptura institucional

O inquérito revela que, após a derrota de Bolsonaro nas urnas, o grupo manteve os ataques às instituições e estimulou manifestações em frente a quartéis do Exército. A ideia era criar um clima de instabilidade e pressionar a cúpula militar para aderir à intervenção.

Em novembro de 2022, oficiais do Exército ligados ao plano golpista realizaram reuniões para tentar convencer o Alto Comando da Força a apoiar um golpe de Estado. Esses militares, identificados como integrantes das Forças Especiais do Exército, eram treinados em missões de inteligência e operações clandestinas.

As investigações mostram que um general do Exército chegou a garantir a Bolsonaro que, caso ele assinasse um decreto de ruptura institucional, haveria apoio militar para consumar o golpe. No entanto, a resistência de parte da cúpula militar frustrou os planos do grupo.

Diante do fracasso da tentativa de golpe institucional, a organização criminosa passou a incentivar a escalada de violência.

“A frustração dominou os integrantes da organização criminosa que, entretanto, não desistiram da tomada violenta do poder nem mesmo depois da posse do Presidente da República eleito”, cita trecho da denúncia.

As campanhas pela intervenção militar prosseguiram com o apoio e orientação da organização. A última esperança da organização estava na manifestação de 8 de janeiro. Seus membros trocavam mensagens, apontando que ainda aguardavam uma “boa notícia”.

A organização incentivou a mobilização de pessoas em frente ao Quartel-General do Exército em Brasília, pedindo intervenção militar na política. Os manifestantes desceram toda a avenida que liga o setor militar urbano ao Congresso Nacional, acompanhados e escoltados por policiais militares do Distrito Federal. A empreitada resultou na invasão e destruição dos prédios dos Três Poderes.

Segundo a denúncia, os ataques ao Congresso, ao STF e ao Palácio do Planalto foram a última tentativa do grupo de reverter o resultado eleitoral por meio da força. O documento aponta que houve facilitação dos atos por parte de agentes públicos, incluindo membros das forças de segurança do Distrito Federal.

A PGR sustenta que Bolsonaro e seus aliados tiveram papel ativo na mobilização dos golpistas, fornecendo apoio moral e material para as manifestações. A acusação destaca que a narrativa falsa de fraude nas eleições foi amplamente disseminada em grupos bolsonaristas nas redes sociais, criando um ambiente propício para a radicalização dos apoiadores do ex-presidente.

STF decidirá se Bolsonaro vira réu

A denúncia apresentada pela PGR será agora analisada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Caso o tribunal aceite a acusação, Bolsonaro e os demais denunciados se tornarão réus e responderão criminalmente pelos atos investigados.

A defesa do ex-presidente já indicou que pretende questionar a imparcialidade do ministro Alexandre de Moraes, relator do caso no STF. Bolsonaro nega qualquer envolvimento em uma tentativa de golpe e alega ser vítima de perseguição política.

Se condenado, Bolsonaro poderá enfrentar penas que, somadas, chegam a até 34 anos de prisão. A expectativa é que o julgamento ocorra ao longo de 2025.

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