Construtoras fraudam sistema de moradias sociais em SP, diz cartórios

Mundo Apto Brooklin, na zona sul: obras foram iniciadas. Foto: reprodução

Mais de 1.230 apartamentos em São Paulo foram comprados sob suspeita de fraude em programas de moradia social, segundo informações enviadas pelos cartórios de registros de imóveis ao Ministério Público e à prefeitura da capital. Essas unidades, destinadas a famílias de baixa renda ou de renda média, foram adquiridas por pessoas que não comprovaram estar dentro da faixa de renda exigida, levantando dúvidas sobre o cumprimento das regras do programa.

Desde novembro de 2024, os cartórios são obrigados a notificar o poder público quando identificam irregularidades na compra de moradias sociais. Os dados inéditos, coletados pelo Uol, revelam o envolvimento de nove das dez maiores construtoras da cidade, de acordo com o ranking da Empresa Brasileira de Estudos de Patrimônio (Embraesp).

A política municipal de moradia social oferece vantagens às construtoras, como descontos em impostos e permissão para construir acima da altura permitida, em troca da destinação de parte dos imóveis a famílias com renda de zero a dez salários mínimos.

No entanto, a falta de fiscalização dos contratos de compra e venda tem permitido que unidades sejam adquiridas por investidores e pessoas com renda superior ao permitido. Um exemplo citado é o de um empresário com salário de R$ 86 mil que comprou uma moradia social próxima à Saúde, na zona sul.

O Ministério Público entrou na Justiça para suspender a política municipal, mas uma decisão proferida na sexta-feira (7) extinguiu a ação sem julgamento do mérito. O juiz Renato Augusto Pereira Maia, da Fazenda Pública, ordenou que a gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) instaure procedimentos administrativos para apurar eventuais fraudes e divulgue a lista de famílias atendidas pelas moradias sociais construídas com incentivos.

Prédio em construção na capital paulista. Foto: reprodução

Os cartórios passaram a liberar o registro de moradias sociais em novembro de 2024, mesmo sem comprovação da renda dos proprietários, por ordem do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP). Ao mesmo tempo, começaram a notificar irregularidades, o que se tornou um dos principais meios de fiscalização. Antes, a prefeitura exigia que o registro do imóvel só fosse feito com a comprovação da faixa de renda do comprador.

Os apartamentos suspeitos de fraude estão localizados em bairros como Itaim Bibi, Vila Olímpia, Pirituba, Sacomã e Tucuruvi. A lista inclui 60 construtoras e incorporadoras, além de 70 empreiteiras menores, especialmente na região da Vila Matilde, na zona leste. Os números devem aumentar, já que o procedimento de notificação agora é permanente.

Um dos casos destacados é o do Mundo Apto Brooklin, na zona sul, onde ao menos 50 compradores não conseguiram comprovar estar dentro do limite de renda ao registrar os contratos nos cartórios.

O projeto, com 625 unidades, foi licenciado com unidades enquadradas como Habitação de Interesse Social (HIS) e Habitação de Mercado Popular (HMP), que têm limites de renda familiar definidos. A Mundo Apto Empreendimentos afirmou seguir rigorosamente a legislação e que as condições de compra constam nos contratos.

Outro exemplo é o Alto São Domingos, em Pirituba, da Cury Construtora e Incorporadora S.A., onde ao menos 40 unidades foram vendidas sem comprovação de renda. A Cury declarou que preza pelo atendimento às diretrizes do programa habitacional e colabora com o MP e a prefeitura.

Já a Vivaz Residencial, braço popular da Cyrela, teve 16 prédios listados pelos cartórios, com 69 unidades vendidas sob suspeita de fraude. A Cyrela também afirmou cumprir a legislação.

A Promotoria de Habitação e Urbanismo aponta que os benefícios fiscais e urbanísticos oferecidos ao mercado privado têm proporcionado a prática de “enriquecimento ilícito”.

O órgão vai recorrer da decisão judicial que não suspendeu a política, mas, se comprovadas, as fraudes seguem passíveis de multa e processo judicial. Até agora, a prefeitura abriu nove processos de sanção e aplicou multas de R$ 31 milhões a dois projetos.

A gestão de Ricardo Nunes (MDB) pretende contratar uma auditoria externa para fiscalizar as licenças concedidas mediante subsídio, com um valor previsto de R$ 43,7 milhões. A Cyrela, Tenda, MRV, Plano&Plano, Vibra Residencial, One, Benx, Canopus, Rev3, Econ, M.A.R. Hamburgo e Mf7 Eusébio Incorporadora emitiram notas destacando o cumprimento das normas.

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