Médico francês que estuprou 300 menores também atacava amigos dos filhos

Ilustração do tribunal mostra Joel Le Scouarnec em seu primeiro julgamento em 2020. Imagem: reprodução

O médico francês Joël Le Scouarnec, acusado de ter agredido sexualmente cerca de 300 pacientes, a maior parte deles menores de idade, confessou durante seu depoimento nesta sexta-feira (7) que também cometia violências sexuais contra crianças próximas de sua família. Ele relatou ter agredido amigas de seus filhos, quando as crianças tinham 6 anos de idade.

A mãe da menina estava na sala ao lado, conversando com o restante da família. Algumas semanas depois, na mesma casa, o médico a seguiu quando S. foi ao banheiro e houve uma nova penetração. Na terceira tentativa, em um outro dia, a criança conseguiu fugir e lembra de ter “corrido para perto da mãe”.

Em seu depoimento, Joël Le Scouarnec diz no início que não se lembra do nome da vítima, mas, pela primeira vez desde o começo do processo, deu detalhes precisos do que ele chamou de “episódio do banheiro”.

“Aproveitei o fato de que (um dos meus filhos) estava trazendo amigos (para a casa) para abusar deles”, confessou. Naquele dia, “eu estava atento ao momento certo e, quando vi a pequena S. indo ao banheiro, fui atrás dela para cometer os atos sobre os quais escrevi”, completou o médico, fazendo referência aos diários usados para registrar suas agressões.

Apesar das longas descrições, desde o início de seu julgamento, em 24 de fevereiro, o acusado justificou não se lembra da violência sexual que infligiu às suas vítimas pois dizia sofrer de “memória seletiva”. Mas ao ser questionado nesta sexta-feira pela juíza, Aude Buresi, que frisou a recordação tão precisa por parte do acusado do “episódio do banheiro”, o médico admitiu ter “cometido esses atos” e reconheceu tê-la “estuprado”.

Em seguida, ele explicou que a sua estratégia era falar o mínimo possível durante e após as agressões para, numa tentativa de banalizar o que fazia, silenciar as crianças. “Vocês acham que eu teria corrido o risco de dizer a uma criança: ‘Acima de tudo, não diga nada’? Isso teria chamado ainda mais a atenção. Eu queria que o que eu estivesse fazendo parecesse natural. Dizer à criança: ‘Cale a boca, é um segredo, você não deve dizer nada’ teria parecido estranho”, observa.

“Eu só pensava em mim mesmo. O que me interessava era satisfazer meu desejo, meu impulso pedófilo”, enfatizou, referindo-se ao seu “sentimento de impunidade” e às suas numerosas vítimas na época.

Entenda o processo

Joël Le Scouarnec é alvo de 111 acusações de estupro e 189 de agressão sexual cometidos entre 1989 e 2014. Os casos são agravados pelo fato de que ele abusou de sua posição como médico e que 256 das 299 vítimas tinham menos de 15 anos quando foram agredidas.

O processo começou oficialmente em 2 de maio de 2017, quando a casa do cirurgião foi revistada pela polícia. Alguns dias antes, sua vizinha havia apresentado uma queixa. Ela acusou o cirurgião de atacar sexualmente sua filha de 6 anos através da cerca do jardim. Três anos depois, em 2020, ele foi condenado a 15 anos de prisão por estupro e abuso sexual dessa menina, bem como de uma paciente e duas de suas sobrinhas.

Esse primeiro caso abriu uma ‘caixa de Pandora’, pois durante as buscas na residência do médico a polícia descobriu não apenas pornografia infantil, como também dezenas de diários nos quais ele descrevia minuciosamente seus crimes e suas vítimas. As informações encontradas revelaram que as agressões já duravam mais de duas décadas e que centenas de pessoas, principalmente crianças, teriam sido abusadas.

No entanto, em 2004, o FBI havia identificado o nome do médico durante uma investigação sobre a compra de pornografia infantil em sites russos. A polícia francesa foi informada e, no ano seguinte, ele foi condenado a quatro meses de prisão com sursis (suspensão condicional da pena). Dois dos hospitais onde o médico trabalhou desde então haviam sido informados das condenações. Porém, Joël Le Scouarnec continuou a trabalhar atendendo crianças até sua aposentadoria, em 2017.

Publicado originalmente em RFI. 

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