Cortes de Trump ao USAID espalham “pânico” pelo mundo; entenda

Contêiner da USAID ao lado de um triciclo em Manila, Filipinas, 4 de fevereiro de 2025: agência anunciou licença administrativa para funcionários nos EUA e no exterior. Foto: Jam Sta Rosa/AFP

As decisões do governo de Donald Trump de cortar recursos para a ajuda internacional e para a ONU estão gerando impactos devastadores em todo o mundo, deixando milhões de pessoas em situação de extrema vulnerabilidade. Mulheres grávidas sem assistência para partos, refugiados sem comida, pacientes de Aids sem tratamento e o fim do monitoramento de secas são apenas alguns dos efeitos desses cortes, que já provocam “pânico” em diversas regiões.

Ao completar 80 anos em 2025, a ONU inicia um processo de reformas e cortes de custos para tentar sobreviver à crise financeira, mas as operações humanitárias globais estão em risco, segundo Jamil Chade do Uol.

As agências especializadas das Nações Unidas já começaram a sentir os efeitos dos cortes. A Organização Internacional de Migrações (OIM), por exemplo, anunciou a demissão de 3 mil de seus 22 mil funcionários.

Já o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) suspendeu ou reduziu drasticamente programas de nutrição no Líbano, onde mais da metade das crianças com menos de dois anos não têm acesso a alimentos suficientes. “Fomos forçados a suspender, cortar ou reduzir drasticamente muitos de nossos programas, e isso inclui programas de nutrição”, afirmou Ettie Higgins, representante da Unicef no Líbano.

A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) também admitiu que programas de alimentação no Afeganistão e na África foram suspensos após o corte de US$ 300 milhões em repasses dos EUA. O impacto, segundo a FAO, será o aumento da fome e da insegurança nessas regiões. A agência instruiu seus funcionários a suspender programas e evitar contratos que dependam de recursos estadunidenses.

Tributos foram colocados na porta da sede da USAID após cortes na agência. Foto: Mandel NGAN/AFP

No Programa Mundial de Alimentação da ONU (PMA), os cortes resultaram no fechamento do escritório da agência na África do Sul e na redução pela metade da alimentação entregue aos refugiados rohingya em Bangladesh.

A ração mensal para cada refugiado caiu de US$ 12,5 para apenas US$ 6,00. “Para manter as rações alimentares completas, o programa precisa urgentemente de US$ 15 milhões para abril e US$ 81 milhões até o final de 2025”, alertou o PMA.

Dom Scalpelli, Diretor Nacional do PMA em Bangladesh, destacou a gravidade da situação: “Os refugiados rohingyas em Bangladesh continuam totalmente dependentes da assistência humanitária para sua sobrevivência. Qualquer redução na assistência alimentar os empurrará ainda mais para a fome e os forçará a recorrer a medidas desesperadas apenas para sobreviver”.

Os cortes também afetam diretamente os pacientes de Aids. Segundo a Unaids, agência da ONU para o combate ao HIV, países que perderam o apoio dos EUA estão priorizando a continuidade da terapia antirretroviral, mas há relatos de “pânico” entre os pacientes, que temem interrupções no tratamento.

“Muitos centros de acolhimento financiados pelos EUA e outros espaços seguros para populações-chave altamente estigmatizadas e para meninas adolescentes e mulheres jovens foram fechados”, lamentou a agência.

Na África do Sul, mais de 15 mil funcionários de resposta ao HIV foram afetados pelos cortes. No Quênia, serviços de prevenção e teste de HIV para populações de alto risco foram interrompidos, incluindo a profilaxia pré-exposição (PrEP). Em Botsuana, o fechamento abrupto de centros de acolhimento interrompeu os serviços de teste e tratamento.

O Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), responsável por saúde sexual e reprodutiva, também confirmou o fim de todos os acordos de financiamento dos EUA.

Programas que forneciam cuidados essenciais de saúde materna, proteção contra violência e tratamento de estupro em países como Afeganistão, Chade e Síria foram interrompidos. “As mulheres em zonas de crise serão forçadas a dar à luz sem medicamentos, parteiras ou equipamentos, colocando suas vidas e as vidas de seus bebês em risco”, alertou o UNFPA.

Diante da crise, a ONU iniciou um processo de reformas administrativas profundas. Uma força-tarefa liderada pelo subsecretário-geral Guy Ryder foi criada para promover cortes e melhorar a eficiência. O secretário-geral António Guterres admitiu que a entidade enfrenta uma crise de liquidez, com salários congelados e dificuldades para pagar serviços contratados.

“Os orçamentos das Nações Unidas não são apenas números em uma folha de balanço – eles são uma questão de vida ou morte para milhões de pessoas em todo o mundo”, disse Guterres. Até março de 2025, apenas 73 dos 193 estados-membros haviam pago integralmente suas contribuições, com os EUA devendo mais de US$ 1,5 bilhão.

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