“Sim, sou jornalista e negro. Mas também sou muito mais que isso”, diz perseguido por Zambelli

Luan Araújo, jornalista negro foi perseguido e ameaçado por Carla Zambelli em 2022 – Foto: Reprodução

Há quase três anos, me definem como alguém que estava no lugar certo na hora certa – para mim, eu estava no lugar errado, na hora errada, mas enfim. Como eu aprendi dolorosamente em toda a minha vida, não posso controlar os desejos, atitudes e pensamentos dos outros. E eu cuido dos meus com ajuda de terapia e medicação.

Meu caro Moisés Mendes, com muito mais talento que eu, escreveu um texto aqui no DCM falando sobre mim. E fiquei muito emocionado. Mas eu estou aqui agora para falar do Luan que viveu e tenta viver depois daquele fatídico dia.

Sim, eu sou um jornalista. Hoje atuo longe das redações, mas sempre estou aqui e lá, escrevendo, apurando e ajudando amigos que apuram. Meu desejo sempre foi o de contar histórias. Era um obcecado por pesquisa, apuração e escrita já quando eu tinha uns 12, 13 anos. Adorava me debruçar nisso. E talvez isso tenha sido uma válvula de escape, pois com 11 anos, perdi meu pai para um câncer no cérebro. Ele era meu herói e foi um dos responsáveis por uma infância muito feliz minha.

Como filho único, tenho até hoje só a minha mãe no mundo. E ela só tem a mim. Se não fosse por ela, eu não teria conseguido realizar meu sonho de me formar como jornalista. Dela e, também das políticas públicas criadas a partir do governo Lula (2003-2010). Eu entrei em uma das universidades mais respeitadas de São Paulo como prounista. Algo inimaginável se eu tivesse nascido 10 anos antes.

Completarei 35 anos daqui alguns meses e não posso dizer que minha carreira é um mar de sucesso. Eu gostaria de estar hoje em um patamar muito maior. Tanto financeiro, quanto de atuação mesmo. Mas também tenho meu valor reconhecido. E tenho orgulho de falar que, em todos os lugares que eu passei, consegui cultivar relações ótimas.

E isso me leva aos amigos. Eu fico muito feliz de cultivar com orgulho amizades fortes e duradouras. Busco ser um amigo leal e que ama muito quem está perto de mim. Se não fosse por eles, aliás, eu não sei como eu suportaria o que suporto diariamente desde aquele dia.

Infelizmente, eles não conseguem me ajudar a enfrentar todos os meus fantasmas, e esses são muitos. Eu costumo falar que levo um enquadro policial por ano desde que me dou por gente. Já levei um inclusive no ponto de ônibus voltando da escola com um uniforme da mesma. Já tomei dentro de um Uber voltando de um plantão na madrugada. Sem contar muitos outros.

Sou um corinthiano fanático. Frequento estádios há mais de 30 anos, como uma herança do meu pai. E, admito, estou mais ansioso para a segunda partida da final do Paulistão, contra o Palmeiras na próxima quinta-feira (27), do que com qualquer coisa que ocorra em Brasília nesta semana que vem aí.

Amo samba também. Desfilo anualmente no Camisa Verde e Branco, escola de samba da minha mãe, nove vezes campeã do Carnaval de São Paulo e que me orgulhou muito com o quinto lugar no desfile deste ano.

E são essas pequenas felicidades que são minha válvula de escape para o mundo que não foi nada gentil comigo. E nelas que tento me apegar. O Luan que pode ser pintado como “homem negro” (o homem negro aliás, tem esse péssimo costume de ser apagado por todos, por ser a carne mais descartável do país), tem muitas camadas, boas e ruins. Mas busca, diariamente, ao menos um pouco de dignidade.

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