
“O governo Trump não é tão imune às dores do mercado quanto pode ter parecido por um tempo. Seu limite de dor acaba de se tornar aparente”. Essa é a visão de Bhanu Baweja, estrategista do UBS, após Donald Trump ceder na tarde da última quarta-feira (9) ao pausar muitas das tarifas comerciais (exceto para a China). Ele destaca que Trump voltou atrás, “mas o estrago não foi todo desfeito”.
“Os EUA não estão entrando em uma briga comercial com todos os parceiros comerciais, pelo menos não hoje”, avalia o estrategista, que ressalta que a volatilidade deve diminuir e, com isso, vê uma volta dos compradores.
Para Baweja, os fluxos de ETFs (fundo de índice) para o S&P500 nunca cessaram de fato e provavelmente serão ainda mais fortalecidos, sendo que esses fluxos podem ajudar a impulsionar o mercado positivamente no curto prazo.

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Contudo, o estrategista do UBS tem uma má notícia. A visão é de que o impacto no crescimento ainda é substancial e não está precificado.
“O mercado havia caído acentuadamente, mas não estava precificando o impacto econômico das tarifas recíprocas + universais anunciadas na semana passada. Até ontem, o consenso era de um crescimento dos lucros do S&P500 de 11,2% em 2025 e 12,4% nos próximos 12 meses. As expectativas consensuais estão defasadas, portanto, se assumirmos que a estimativa real de lucros futuros teria se ajustado rapidamente para uma contração de 5%, o múltiplo atribuído a esses lucros antes do rali de hoje era de 23,7 vezes o múltiplo de preço sobre o lucro futuro”, aponta.
As expectativas atuais do mercado não são consistentes com uma recessão (e um colapso muito maior na demanda doméstica) que o estrategista acredita que as tarifas recíprocas e universais teriam causado.
Ao pé da letra, a combinação de tarifas aumentadas sobre a China e tarifas recíprocas reduzidas significará tarifas apenas ligeiramente mais baixas no total em dólares americanos. “É certo que as tarifas chinesas também podem ser inevitavelmente negociadas para valores mais baixos. A distribuição de tarifas também importa para os mercados. Assumindo apenas 10% de tarifas universais e cerca de 50% de tarifas chinesas, acreditamos que o impacto no PIB e, particularmente, na demanda doméstica pode ser grande o suficiente para que o crescimento dos lucros precise ser reduzido para um dígito baixo, potencialmente até estável”, ressalta o UBS.
Neste sentido, não está claro se o Federal Reserve seria capaz de socorrer e recuperar essa fraqueza do crescimento imediatamente. O estrategista ressalta que a ata da reunião do Fed de 18 e 19 de março foi divulgada na véspera e sugere que o Fed estava preocupado com a persistência da inflação induzida por tarifas.
“Nossa equipe econômica prevê que o PCE (índice de inflação preferido do Fed) suba além de 4% este ano, mesmo com essas tarifas reduzidas. Após seus problemas de comunicação em 2022, em meio a esse cenário de alta inflação, acreditamos que o Fed provavelmente errará por ser reativo em vez de proativo”, avalia o estrategista do banco.
Ele ainda lembra que, “correndo o risco de afirmar o óbvio”, embora haja um adiamento de 90 dias das tarifas mais pesadas, não está claro se as tarifas recíprocas não aumentarão novamente. Assim, espera que a incerteza impacte negativamente a atividade econômica.
Assim, Baweja aponta ser vendedor nos momentos de rali até entender mais sobre o tema.
“O governo mudou rapidamente de ideia antes que um mercado em baixa se estabelecesse e antes que quaisquer problemas de financiamento pudessem surgir e criar ciclos secundários. (…) Acreditamos que mesmo essas tarifas reduzidas implicarão um sério impacto no crescimento. Esperamos que as revisões negativas dos lucros continuem e criem um vento contrário para o mercado. Não esperamos que as máximas sejam testadas e recomendamos vender os ralis até termos mais informações”, conclui.
E a América Latina?
Já a equipe de estratégia do Bradesco BBI para a América Latina aponta que o foco agora se desloca para o impasse e a negociação com a China, a fraqueza da moeda do gigante asiática (yuan) e a resposta fiscal.
“Acreditamos que a América Latina esteja relativamente protegida da turbulência comercial e dos crescentes riscos de recessão, estando bem posicionada em nossa estrutura de alocação global, com mercados de câmbio e ações duplamente descontados, baixas correlações macroeconômicas globais e fatores locais de ‘autoajuda’ – do fiscal do Brasil à reforma argentina e às eleições no Chile”, avaliam os estrategistas.
Para o BBI, o Brasil, para quem tem recomendação neutra, terá pouco impacto em sua economia fechada, sendo afetado pela tarifa mínima recíproca de 10%.
“Seu ciclo econômico assíncrono e as taxas de juros reais mais altas do mundo, na verdade, se beneficiam de uma desaceleração econômica mais rápida e impulsionada externamente”, avalia o BBI, ressaltando que tem adicionado em sua carteira ações com sensibilidade às taxas de juros, empresas estatais e beneficiários do mercado de capitais.
O banco destaca ainda que o índice Merval, da Argentina, liderou os ganhos na região com alta de 9,69% na véspera. “O Brent se recuperou para US$ 65/barril, e o FMI anunciou um acordo de US$ 20 bilhões, essencial para reconstruir as reservas cambiais e afrouxar os controles”, aponta a equipe de estratégia, que tem exposição overweight (acima da média) para o país na América Latina.
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