
Uma semana após a deflagração da Operação Sem Desconto, novos detalhes reforçam a suspeita de conluio entre servidores do INSS e associações investigadas por aplicar descontos irregulares em aposentadorias e pensões. A ação conjunta da Polícia Federal (PF) e da Controladoria-Geral da União (CGU) aponta que o esquema desviou até R$ 6,3 bilhões entre 2019 e 2024.
Segundo a investigação, fraudes eram cometidas mediante falsificação de autorizações para descontos destinados a associações que prometiam vantagens como descontos em academias, serviços e honorários advocatícios.
Entenda, a seguir, o que se sabe até agora sobre o caso, segundo informações reveladas pela PF.
Desbloqueio irregular contrariou decreto
Em outubro de 2023, a Coordenação-Geral de Pagamento de Benefícios do INSS recomendou o desbloqueio de benefícios para aplicação de descontos associativos. A medida contrariou um decreto de junho de 2020, que exige autorização pessoal e específica do beneficiário para esse tipo de desconto.
No mês seguinte, o INSS autorizou o desbloqueio em lote de 34.487 benefícios. Segundo fontes internas citadas pela PF, o objetivo era dar vazão a um volume elevado de solicitações não processadas por falhas técnicas.
Evidências de irregularidades
Entre 2019 e 2023, houve um salto de 2.011% no volume de contribuições a oito associações analisadas, enquanto o aumento médio de todas as entidades foi de 115%.
A PF apura ainda desvios para empresas de viagens, buffets e eventos, sem vínculo com atividades sindicais. Apenas na Contag, as movimentações financeiras atípicas somaram mais de R$ 26 milhões.
Uso do dinheiro por empresas privadas
A PF apura o destino dos recursos obtidos. Parte foi transferida a empresas de turismo, eventos e alimentação que não possuem vínculo com atividades sindicais. Relatórios de inteligência financeira mostram movimentações atípicas que superam R$ 26 milhões, apenas no caso da Contag.
A investigação detectou concentração incomum de descontos associativos em cidades com baixo IDH. Em municípios de Maranhão, Piauí e Pernambuco, mais de 60% dos segurados tiveram os benefícios impactados.
Servidores sob suspeita
A PF identificou que ex-diretores e pessoas ligadas ao INSS receberam mais de R$ 17 milhões em transferências de intermediários das associações investigadas. Entre os casos apontados:
- Um dos servidores beneficiados teria recebido um carro de luxo, avaliado em mais de R$ 500 mil, registrado em nome da esposa do procurador do INSS Virgílio Oliveira Filho — afastado pela Justiça;
- Pessoas e empresas ligadas ao ex-diretor de Benefícios André Paulo Félix Fidelis receberam R$ 5,1 milhões;
- Alexandre Guimarães, ex-diretor de Governança do INSS, teria recebido R$ 313 mil.
A figura central do esquema seria Antonio Carlos Camilo Antunes, conhecido como “Careca do INSS”. Segundo a PF, ele movimentou R$ 53,5 milhões em recursos de entidades sindicais e intermediários, em valores muito superiores à sua renda formal de R$ 24,4 mil mensais. Relatórios indicam que o dinheiro era rapidamente repassado para dificultar o rastreamento.
Os citados negam as acusações e alegam que ainda não tiveram acesso aos autos.
Atuação de Stefanutto
O então presidente do INSS, Alexandre Stefanutto, exonerado após a operação, também é citado. Conforme a PF, Stefanutto liberou descontos em massa para a Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura) após reunião com representantes da entidade em junho de 2023, contrariando parecer interno da Procuradoria do INSS e um decreto de 2020.
Em novembro, o INSS desbloqueou descontos em 34.487 benefícios sem a devida autorização individual dos beneficiários. A Contag nega irregularidades e afirma ter atuado “com ética e responsabilidade”.
Lupi resiste no cargo
Apesar do desgaste político, o ministro da Previdência, Carlos Lupi, permanece no cargo. Integrantes do governo dizem que ele não está diretamente implicado e que “não há nada contra ele” até o momento.
Lupi, que assumiu inteiramente a indicação de Stefanutto, teria sido alertado sobre os descontos irregulares no ano passado e admite demora para coibir fraudes, mas nega omissão. Logo após o caso vir à tona, o ministro disse que não deixaria o cargo, e seu partido, o PDT, saiu em sua defesa, afirmando que “demitir Lupi é demitir o partido”, indicando que a queda do ministro resultaria na saída da sigla da base do governo.
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