
A força do dólar pode ter atingido seu pico, e o mundo está se reorganizando em torno de um novo equilíbrio geopolítico e econômico. Essa é a visão dos sócios da Legacy Capital, Felipe Guerra (CIO) e Pedro Jobim (economista-chefe), que participaram do programa Stock Pickers, apresentado por Lucas Collazo e Henrique Esteter.
Em uma conversa densa sobre as mudanças da economia global, Felipe Guerra argumentou que o ambiente de desconfiança em relação aos Estados Unidos está levando investidores e bancos centrais a repensarem a exposição ao dólar. “Há uma série de fatores que culminam em uma visão mais antidólar. A confiança no sistema americano está sendo questionada”, afirmou, apontando que a postura mais agressiva de Donald Trump — com tarifas comerciais e ataques à ordem institucional — agrava essa percepção.
Desaceleração cíclica dos EUA
Segundo Guerra, mesmo antes da possível volta de Trump ao poder, os EUA já vinham em uma desaceleração cíclica, com o Federal Reserve em compasso de espera e o dólar perdendo força. A eventual retomada de uma agenda protecionista, com tarifas contra parceiros históricos, tem potencial para romper a confiança construída ao longo de décadas. “Sempre se soube como as regras funcionam nos Estados Unidos. Isso está sendo colocado em xeque”, diz.
O cenário, segundo os gestores, é de um dólar em tendência de enfraquecimento, acompanhado por um crescimento mais sincronizado entre as economias. “O mundo vai ter que fazer mais política fiscal, consumir mais, enquanto os EUA farão menos. Isso é parte de um reequilíbrio que pode beneficiar outras moedas, como o euro e o ouro nas reservas internacionais”, explica Guerra.

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Guerra entre Rússia e Ucrânia
Esse movimento, acrescenta ele, remete ao início da guerra entre Rússia e Ucrânia, quando mesmo que o conflito acabasse, a Europa já havia perdido a confiança na dependência energética da Rússia. “É o mesmo com os EUA agora. Mesmo que tudo se normalize, o investidor global começa a questionar se pode continuar a confiar do mesmo jeito”, afirma.
Felipe Guerra também citou o risco de um ambiente geopolítico ainda mais fragmentado, com os EUA em rota de colisão com a China, e tensões latentes em outros pontos do globo, como a escalada entre Índia e Paquistão. “Há um risco central na escalada tarifária entre EUA e China, com potenciais consequências graves para o crescimento global”, alerta.
Na visão da Legacy, os três maiores riscos para os mercados atualmente são:
- A escalada da tensão entre Estados Unidos e China, que pode dividir o mundo em blocos econômicos antagônicos;
- A desaceleração global induzida por políticas econômicas mais restritivas, inclusive nos EUA;
- A fragmentação da confiança no modelo institucional norte-americano, que pode provocar fuga de capitais e rearranjo nas reservas globais.
Com tudo isso em jogo, Guerra diz que o mercado já começa a se posicionar. “Se o ambiente for mais calmo, veremos venda de dólar contra moedas cíclicas, como o real e o peso mexicano. Se for mais volátil, o ouro, o ien e o franco suíço ganham força”, diz.
E conclui: “A tendência de enfraquecimento do dólar está em curso, a menos que vejamos um retorno à narrativa de excepcionalismo americano — o que hoje parece distante”.
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