TCU: Até mortos e crianças “compraram” armamentos durante o governo Bolsonaro

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Foto: reprodução

O relatório de auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) revelou que pelo menos 2 milhões de munições foram vendidas de forma irregular no país durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Com informações da Folha de S.Paulo.

De acordo com dados do Sicovem (Sistema de Controle de Venda e Estoque de Munições), utilizado pelo Exército, as munições foram adquiridas utilizando CPFs de menores de 18 anos e de pessoas falecidas, além de não informarem o número de registro adequado da arma.

A auditoria também destacou que o sistema permitiu a venda de munições em calibres diferentes dos relacionados às armas registradas. Por exemplo, foi possível comprar munição de fuzil 5,56 mm utilizando o documento de uma arma calibre 22.

Entre as irregularidades detectadas, foram registradas 164 vendas a 151 CPFs de menores de 18 anos, além de 6.669 munições destinadas a pessoas falecidas. Outras 30.409 foram liberadas para armas que já constavam no sistema como perdidas, roubadas ou furtadas, e ainda 267.993 munições destinadas a colecionadores e armas de acervo de coleção que, na prática, não podem ser usadas. Os dados foram compilados pelo Instituto Sou da Paz.

De acordo com Bruno Langeani, consultor sênior da entidade, após os problemas de liberação de armas com registro no Exército para criminosos, o ponto mais grave é o das munições.

“O sistema atual usado por lojistas é praticamente um formulário online, que aceita acriticamente qualquer informação fornecida, sem travas que previnam fraudes”, disse.

Uma organização criminosa liderada por irmãos gêmeos no Maranhão foi acusada de despejar cerca de 60 toneladas de munição no mercado ilegal do Brasil. Essa organização só conseguiu agir devido a uma falha primária no Sicovem.

A investigação conduzida pela Polícia Civil e pela Promotoria do Maranhão revelou que membros da suposta organização introduziram informações falsas no sistema do Exército por mais de um ano, de novembro de 2020 a março de 2022.

O Sicovem, um sistema utilizado pelo Exército, foi desenvolvido para monitorar em tempo real a venda de munições desde o fabricante até o consumidor final, visando evitar possíveis desvios.

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em um clube de tiro. Foto: reprodução

Implementado em 2007 por meio de uma portaria do Ministério da Defesa, o Sicovem é de propriedade da CBC (Companhia Brasileira de Cartuchos), que detém praticamente o monopólio na venda de munições para uso não militar no Brasil. No entanto, essa relação tem sido alvo de críticas por parte de especialistas em segurança pública.

“O cerne do problema está no abandono do Exército em ter um sistema próprio. O Exército confia em usar um sistema da empresa, que se beneficia mais quanto maior for o volume de suas vendas, e que, portanto, não tem interesse em travar. Esse interesse deveria ser do poder público, representado pelo Exército”, disse Langeani.

A falta de controle na venda de munições foi tema de uma audiência pública realizada na Comissão de Segurança Pública do Senado no último dia 19. Na ocasião, o general Marcus Alexandre Fernandes, diretor de Fiscalização de Produtos Controlados do Exército Brasileiro, afirmou que medidas estão sendo tomadas para resolver a situação.

“Nós iniciamos o desenvolvimento de um sistema novo em 2021, ele não está finalizado. Falta pouco para termos um Sicovem com cruzamento de dados, a pessoa terá que entrar com o gov.br, e o CPF já vai ser buscado no site da Receita”, disse.

E acrescenta: “Vai ter acesso também à base de dados do Sigma [Sistema de Gerenciamento Militar de Armas], tendo acesso aos dados dos atiradores. A gente acredita que tão logo esse sistema esteja pronto, nós consigamos resolver de forma definitiva esse ponto”, disse.

O deputado Alberto Fraga (PL-DF), líder da bancada da bala e presidente da Comissão de Segurança e Crime Organizado da Câmara, destacou a negligência de autoridades públicas que precisam ser responsabilizadas.

“Me assusta o TCU fazer um relatório desses, ele tem que fiscalizar as contas, virou polícia? Nós temos que disciplinar para não acontecer esse tipo de coisa, disciplinar é uma coisa e marginalizar os atiradores é outra”, disse.

Além disso, o TCU apontou outras irregularidades, como o fato de pelo menos 8% das armas apreendidas em atividades criminosas no estado de São Paulo pertencerem a CACs (colecionadores, atiradores desportivos e caçadores).

Adicionalmente, entre 2019 e 2022, cerca de 5.200 indivíduos condenados pela Justiça conseguiram obter, renovar ou manter o registro de CAC no Exército, apesar de enfrentarem acusações por porte ou posse ilegal de armas, lesão corporal e tráfico de drogas.

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