Cândido e os bichos

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Cândido pulava de um serviço a outro sem se satisfazer em nenhum. Primeiro, ainda adolescente, guiado pela necessidade e pela vontade de se fazer independente, foi balconista de farmácia.

– Isso não é vida não. Ainda se aplicasse injeção em cachorro. Vou estudar.

Determinado, meteu a cara nos livros, passou no vestibular e se formou em direito, porque disseram que lhe daria uma boa posição social. Empregou-se em um escritório de advocacia, mas ali também não encontrou satisfação.

– Diploma pra ficar resolvendo briga de marido e mulher, tô fora. Ainda se fosse resolver com quem fica a guarda dos gatos, dos papagaios…

Foi passear no cemitério, onde os moradores tendem a ser silenciosos a maior parte do tempo, para encontrar um novo rumo. Não era uma pessoa especialmente brilhante, mas também não podia ser considerado um idiota. Reconhecia que era desprovido de charme e empatia, mas era esforçado.

– Já sei: vou prestar concurso e trabalhar no Ministério Público. E vou ter uma casa bem grande, onde caibam uns quatro cachorros, porque bicho é que é bom.

E assim Cândido fez. Não passou de primeira, mas na terceira tentativa conseguiu a almejada nomeação. Belo salário, mas muita gente para lidar. Fazia o feijão com arroz sem muito ânimo, pensando apenas na hora de voltar para casa e ficar com os bichos.

– Gente dá muito trabalho.

Os dias passavam e Cândido não achava alegria em tarefa alguma que fazia. Foi sentado em um banco da praça de fronte ao edifício do Ministério Público, dando milho aos pombos numa tarde de setembro, que lhe veio a iluminação:

– Passarinho só voa porque tem o vento dentro dos ossos.

Cândido pediu exoneração e desde então se dedica ao ofício de passear com cachorros alheios.

– Agora sou “dog walker”.

Às vezes leva até seis cachorros num só passeio, com notável destreza para que as guias não embolem, sempre com um sorriso no rosto. E cobra um bom preço pelos serviços, porque, por alguma razão, os bichos gostam muito dele e sua agenda está sempre cheia. Os donos não veem muita graça em Cândido, mas reconhecem nos cachorros uma alegria genuína quando ele bate à porta para buscá-los, e isso lhes basta como crédito.

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