Incerteza geopolítica global pode agravar riscos econômicos do Brasil, diz Eurasia

Além da significativa pressão financeira herdada dos últimos meses de 2024, o Brasil entra em 2025 bastante pressionado por condições geopolíticas e econômicas externas mais desafiadoras. O cada vez mais percebido déficit de liderança global avança num momento de troca de comando e de diretrizes nos Estados Unidos, enquanto crescem as chances de ruptura com a China, trazendo cada vez mais insegurança para países emergentes. O diagnóstico está no relatório “Top Risks 2025”, da Eurasia.

A análise da consultoria global lista os 10 principais riscos do ano e aponta ainda como eles podem afetar o Brasil. Segundo a Eurasia, entre os principais riscos geopolíticos em 2025, os que mais afetam o Brasil são aqueles que levam a um cenário global desfavorável para as economias de mercados emergentes.

“Se o cenário econômico global se deteriorar (…), aumenta o risco de que o Brasil entre em uma nova recessão, o que abalaria a política às vésperas de uma eleição acirrada em 2026”, diz o texto assinado pelos executivos Ian Bremmer e Cliff Kupchan.

A consultoria destaca que o Brasil já entra em 2025 sob significativa pressão financeira por conta de crescentes preocupações com suas contas fiscais. “A incapacidade do governo de Luiz Inácio Lula da Silva de acalmar as preocupações dos investidores em relação aos níveis crescentes da dívida contribuiu para uma queda de 27% no real em 2024, que, por sua vez, colaborou para que o Banco Central elevasse as taxas de juros”, lembra o texto.

A maior parte dos riscos econômicos que podem acometer o Brasil neste ano estão relacionados à agenda que Donald Trump deve implementar nessa sua segunda gestão, apelidada no texto de “Trumponomics”.

“Donald Trump está prestes a herdar uma economia americana robusta, mas suas políticas minarão sua força este ano por meio de uma inflação mais alta e crescimento reduzido”, prevê a consultoria.

A análise é que, se as políticas de Trump sobre imigração, comércio e gestão fiscal contribuírem para uma inflação mais alta e um dólar mais forte, os problemas econômicos do Brasil vão se aprofundar. “O real pode depreciar-se ainda mais, alimentando pressões inflacionárias que limitariam a capacidade do BC de reduzir os juros em 2025, após um ciclo de aperto monetário”, diz o relatório.

O Brasil sentiria os efeitos potenciais de altas nos juros e na inflação dos EUA, dado seu endividamento substancial (78% do PIB) e baixa taxa de poupança (cerca de 15% do PIB). “O Brasil tem tomado empréstimos para financiar mais do que investimentos; com um déficit de quase 8% do PIB, tem recorrido aos mercados financeiros para cobrir despesas previdenciárias e serviços essenciais”, explica a Eurasia.

Guerras comerciais

Outro risco citado que pode tornar o ano ainda mais difícil para o Brasil é o de um menor crescimento global causado por guerras comerciais revanchistas – em especial entre EUA e China. “Isso pesaria sobre os preços das commodities, que representam a maior parte das exportações do Brasil; o barril abaixo de US$ 60 reduziria as receitas advindas da produção de petróleo”, projeta o texto.

Segundo a Eurasia, a forma como o governo Lula vai lidar comesse cenário econômico será crucial. “O Instituto Fiscal Independente estima que, para estabilizar a dívida, sejam precisos superávits primários de 2,4% do PIB. Mas um ajuste dessa magnitude exigiria cortes de gastos impensáveis para Lula. Seu governo cortará alguns gastos discricionários e implementará medidas para aumentar a receita, mas é improvável que faça o suficiente para aliviar o estresse do mercado — que poderia alimentar mais inflação ao enfraquecer o real.”

Ainda assim, a consultoria acredita que uma crise econômica generalizada é improvável. “O crescimento não deve entrar em colapso em 2025, e o Banco Central seguirá independente, cumprindo seu mandato de buscar a meta de inflação. Mas um cenário global mais negativo aumentará as preocupações do Palácio do Planalto em relação às chances de reeleição de Lula em 2026 e estimulará o enfraquecimento das políticas”, diz o texto.

“Um cenário global negativo aumentaria as chances de um candidato de oposição favorável ao mercado vencer em 2026, mas também inflamaria o sentimento antissistema e abriria as portas para um resultado inesperado”, alerta.

Oportunidades

Apesar de citar efeitos negativos de uma possível ruptura entre EUA e China, como o mercado brasileiro ser inundado por produtos chineses, minando os produtores domésticos em setores-chave como os de petroquímica, manufatura e vestuário, a Eurasia também vê algumas oportunidades nesse cenário.

“O Brasil também se beneficiará de insumos chineses mais baratos, que se provarão deflacionários. No primeiro mandato de Trump, os exportadores agrícolas do Brasil ganharam participação de mercado quando a China taxou produtos agrícolas dos EUA em retaliação contra tarifas norte-americanas”, lembra o relatório.

Segundo a consultoria, ainda que o Brasil não deva ganhar tanto com uma nova guerra comercial — uma vez que a China já importa do Brasil cerca de 60% de toda a soja que precisa — ainda pode ter algum benefício marginal.

Sobre as relações do Brasil com os EUA no novo mandato de Trump na Casa Branca, o texto alerta que, como o país exerce neste ano a presidência rotativa dos BRICS, qualquer movimento que faça para desafiar a dominância do dólar ou apoiar a China pode provocar ações retaliatórias.

“Além disso, uma possível condenação ou prisão do ex-presidente Jair Bolsonaro, aliado de Trump, poderia acirrar ainda mais a polarização política, possivelmente incitando Trump ou membros de seu governo a expressarem solidariedade a Bolsonaro”, comenta, acrescentando que os membros do governo brasileiro hoje carecem de canais de comunicação robustos com o futuro governo dos EUA, o que pode prejudicar o engajamento bilateral.

Mesmo a incerteza geopolítica global também abre oportunidades para o Brasil, diz a consultoria. “À medida que os países intensificam sua busca por segurança alimentar e energética, o Brasil pode se integrar a novas cadeias de produção ou expandir para mercados consumidores emergentes”, cita.

Outra oportunidade citada está relacionada ao risco classificado como “impasse mexicano”. “A piora na estabilidade institucional do México e a incerteza em relação ao futuro do Acordo EUA-México-Canadá podem deslocar investimentos de longo prazo para o Brasi –especialmente de multinacionais que buscam economias de escala para atender melhor o mercado consumidor da América Latina”, diz o texto.

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