Além do IMC: proposta sugere nova abordagem para identificar a obesidade

Obesidade

Uma comissão global, publicada na noite desta terça-feira (14), na revista científica The Lancet Diabetes & Endocrinology, propõe uma nova abordagem para classificar e diagnosticar a obesidade

A proposta é simples: ir além do Índice de Massa Corporal (IMC) para identificar a condição, utilizando outras medidas de excesso de gordura corporal, assim como demais sinais e sintomas objetivos de problemas de saúde no nível individual.

O estudo pontua que isso pode resultar em diagnósticos equivocados, assim como demais consequências negativas para o paciente com obesidade e para a sociedade em geral, uma vez que há muito estigma sobre a doença. 

Ricardo Cohen, coautor da publicação do The Lancet e head do Centro Especializado em Obesidade e Diabetes do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, também é presidente mundial da Federação Internacional de Cirurgia da Obesidade e Distúrbios Metabólicos (IFSO). 

Ele acredita que usar somente o IMC não é um indicador confiável para entender a gordura corporal de alguém. 

“O IMC simplesmente mede apenas o tamanho do indivíduo, não mede a gravidade, não é um diagnóstico de doença e não indica onde a gordura está depositada”, disse Cohen, em entrevista exclusiva ao InfoMoney

O médico reforça que o IMC é um marcador epidemiológico que serve apenas para dizer se a pessoa é grande ou não.

Com a nova abordagem, a definição e o diagnóstico tradicional passariam por uma redefinição. A mudança ajudaria, na prática, a formular políticas públicas de saúde mais certeiras para que pessoas com obesidade recebam os tratamentos corretos. 

Entendimento sobre a condição

Outro ponto importante feito pela Comissão é o fim da disputa sobre se a obesidade é uma doença ou não.

Em nota à imprensa, o presidente da Comissão, professor Francesco Rubino, do King’s College London no Reino Unido, disse acreditar que a questão sobre se a obesidade é uma doença é equivocada, já que a consideração mais comum é de algo binário e simples como um “sim” ou “não”.

“As evidências, no entanto, mostram uma realidade mais complexa”, disse, em nota. “Alguns indivíduos com obesidade podem manter a função normal dos órgãos e uma saúde geral, mesmo a longo prazo, enquanto outros apresentam sinais e sintomas de doença grave aqui e agora”.

Cohen explica que não existe nenhuma doença crônica não transmissível que não tenha sinais e sintomas objetivos para o seu diagnóstico. 

Ricardo Cohen. Créditos: Imprensa/Roberto Assem

Ele ressalta que uma doença tem sinais e sintomas. “Por exemplo, depressão, lúpus, diabetes — todas elas têm sinais e sintomas, e seus tratamentos são baseados neles”, afirmou. 

Além disso, há também critérios para remissão e prevenção. Por isso, a mudança nas categorias de obesidade são importantes, já que até então o termo era usado como uma definição guarda-chuva, ampla e genérica. 

“Alguns acreditavam até que fosse um problema comportamental, mas sabemos que não é. Decidimos fazer a pesquisa para que a obesidade seja tratada da mesma forma que qualquer outra doença crônica não transmissível”, disse.

Novas categorias

A Comissão apresentou em sua pesquisa um modelo novo para o diagnóstico de doenças relacionadas à obesidade, baseado em medidas objetivas de adoecimento em nível individual.

A primeira é a obesidade clínica, que é considerada uma condição associada a sinais e/ou sintomas objetivos de redução na função dos órgãos, ou uma capacidade significativamente diminuída de realizar atividades diárias padrão (como tomar banho, se vestir, controlar a continência, etc) que esteja ligada diretamente ao excesso de gordura corporal. 

Quem está dentro dessa categoria precisa ser avaliado como portador de doença crônica em andamento e receber tratamentos adequados.

São 18 critérios estabelecidos pela Comissão para realizar o diagnóstico de obesidade clínica em adultos e 13 critérios específicos para crianças e adolescentes.

Já a obesidade pré-clínica é uma condição de obesidade com função normal dos órgãos, com pessoas que não apresentam doenças em andamento, corram o risco de desenvolvê-las (como diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares, certos tipos de câncer e transtornos mentais, entre outros). 

Mudanças nas políticas públicas e planos de saúde

Cohen explica que, no Brasil, são aproximadamente 40 milhões de pessoas com obesidade pelo IMC. “Mas, com nossa abordagem, identificamos que apenas 12 milhões realmente precisam de tratamento imediato, enquanto o restante pode ser alvo de políticas públicas preventivas”, disse.

O médico destaca que a definição da obesidade com base no IMC é o acúmulo de gordura ou tecido adiposo que leva a risco para a saúde, ou seja, com a proposta de reformulação da Comissão, haverá mudanças nos sistemas de saúde, tanto públicos quanto privados.

Administradores de saúde, por exemplo, contestavam que a obesidade não é uma doença, mas sim um fator de risco à saúde. Então não haveria tratamento, já que é algo preventivo. 

Além disso, com as novas categorias, há uma melhor alocação de recursos. “Se você administra um plano de saúde, ao identificar pacientes com obesidade clínica, é possível direcionar recursos para tratamento imediato de quem realmente precisa e adotar estratégias preventivas para os demais”, destacou Cohen.  

No âmbito das políticas públicas, Cohen fala que a situação já era desafiadora, já que o Brasil não possui programas abrangentes para tratar a obesidade, seja com medicamentos ou intervenções preventivas. 

Com a proposta da Comissão, seria possível oferecer mais estratégias para priorizar os casos mais graves e ter esforços para a prevenção. 

Após a publicação, ainda há os próximos passos, como a divulgação da proposta. Cohen lembra que somente nos últimos 10 a 15 anos que tem se falado sobre mudar o sistema do IMC, mas ainda não havia algo concreto. 

“A ideia é mostrar aos sistemas de saúde, tanto públicos quanto privados, que, ao priorizar quem realmente precisa ser tratado, economizamos recursos e beneficiamos mais pacientes”, disse.

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