Cultura Museu de Arte Contemporânea do Ceará apresenta três exposições gratuitas Com anunciações, mandingas e desdobramentos imagéticos, o Museu aposta na poética e rebeldia das imagens para intensificar a programação do ciclo Férias no Dragão

Uma coletiva, duas individuais. E um convite à experiência de imersão sensorial que desafia a neutralidade do cubo branco. Por meio da Convocatória Cena Ocupa, voltada à ocupação dos espaços do Centro Cultural Dragão do Mar de Arte e Cultura (CDMAC), três diferentes exposições ocupam o Museu de Arte Contemporânea do Ceará (MAC-CE). Até o dia 17 de março, o público goza de livre acesso para demorar-se entre as obras de “Anunciação: vou te olhar no vazio imenso”, coletiva de Antônio Breno, biarritzzz, Bruno Gadelha, Camila Fontenele, Ella Monstra, Mike Dutra, Rodrigo Lopes e Tamires Ferreira, sob curadoria de Clébson Francisco; e outras duas individuais em que arte, técnica e magia dialogam: “Mandingueira”, de Pedra Silva; e “O Papel do Papel”, de Samuel Tomé.

Nenhum distanciamento entre os saberes e fazeres artísticos e as inquietações sociais e contextuais. Em cada uma das exposições – e no próprio formato de seleção proposto pelo Centro Dragão do Mar – há um recado político de enfrentamento no campo das representatividades formais para engatilhar ações rebeldes que possam desestabilizar normatizações e afirmar histórias e memórias desconhecidas, negadas ou reprimidas.

“A participação do MAC na convocatória Cena Ocupa, abrindo espaço para as artes visuais, parte de um projeto de descentralização das decisões curatoriais. Através das categorias criadas para a seleção dos participantes, temos o objetivo de contemplar artistas cearenses de gerações, procedências, trajetórias e linguagens diversas, fazendo do MAC-CE um lugar de experimentação, para além da legitimação. Expor e fortalecer a produção artística cearense em sua diversidade, reafirmando e recolocando em cena produções de trajetória mais longa, com abertura para o novo, é o nosso desejo e desafio contínuo”, aferra a gestora do MAC-CE, Cecília Bedê.

Com a palavra, os artistas

Em “Anunciação: vou te olhar no vazio imenso”, o curador Clébson Francisco reúne e conecta obras partindo de materialidades e formas para explorar a relação espacial, dialogando com a própria arquitetura do Museu. O vazio presente no título diz sobre um desejo de operar sobre ele, mas evitando acúmulos, de forma que o público espectador tenha uma atenção individualizada diante de cada obra. “A partir da forma e da matéria, fui conectando as obras, valorizando a geometria, a linha e a curva, que se repetem muito em cada uma delas, assim como o preto e o branco. É uma exposição quase monocromática e tem obras criadas para esse diálogo sensível entre si e com o espaço expositivo. São técnicas e suportes diversos, da pintura em aquarela sobre páginas de livros antigos à instalação sonora em cabaças, todas convergindo para um jogo de luz e sombra que também me interessa”, adianta o curador.

“Mandingueira”, a primeira individual da travesti de pele marrom, macumbeira, artista, arte-educadora e pesquisadora das encruzilhadas, Pedra Silva, é fruto dos últimos cinco anos de pesquisa entre corpo, ancestralidade e natureza. Mas o trânsito por lugares artísticos expandidos, como a performance, o vídeo, a intervenção urbana, a escultura e as artes cênicas, tendo o corpo como arquivo-vivo e lugar transmidiático contra-colonial, completa dez anos. “A exposição no MAC é um momento de exaltação dessa proposta de pensar uma arte ebó, uma arte feiticeira que também é sacra. Isso a partir desse corpo racializado, da travesti que vem disputando, dentro das artes visuais, espaço para tirar da marginalidade a ética e a estética dos povos de terreiro, reivindicando o lugar do sagrado que corpas trans também ocupam. Trabalho com o que chamo de Atuação Ma’kum[b(eira)]. Macumba é uma palavra que remete ao feiticeiro da palavra, aquele que modifica o espaço com a proposição de um novo imaginário. Meu trabalho defende que o que está dentro dos terreiros pode fundamentar o campo da arte, como epistemologia e cosmopercepção”, afirma Pedra.

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Um arquivo de memórias em transe. Em três salas, Pedra Silva instaura “aparições”, mistura sigilos e patuás, espalha rastros e ebó de fumaça, enfileira sete turíbulos em volta de um círculo de sal que dialoga com a estrutura de ferro feita a quatro mãos com o pai ferreiro. Corrosão, tempo, transmutação. O ato performático na tarde de vernissage fez parte da obra e é o primeiro de uma série que acontecerá ao longo da exposição. Não à toa tem como título “Defumação para afastar o Alzheimer Colonial”, evocando a necessária demarcação de espaços sagrados para revolver e libertar memórias reprimidas ou apagadas pelo carrego colonial.

Em sua primeira individual, o artista visual e designer gráfico Samuel Tomé investiga a fundo os desdobramentos do suporte que o permite atuar em fricção com os espaços expositivo e editorial: o papel. Recorrendo ao desenho, à fotografia e ao vídeo, ele se pergunta “Qual o papel do papel” em sua produção artística, dando materialidade a uma questão de pesquisa desenvolvida no mestrado em artes recém-concluído. O nascedouro da exposição são os cadernos do artista, todos eles tomados pelos primeiros desenhos que deram origem a séries autorais que perduram no tempo. “Sala de Espera” tem a cadeira como elemento que se repete e é pensado de muitas formas, enquanto “Cédulas” aponta para o paradoxo da fragilidade do papel face ao seu poder de compra e precificação da vida.

Os modos de circulação no espaço público e em territórios da arte, assim como as relações urbanas, saltam do papel arrancado de anúncios fixados em postes e muros da cidade, assim como de mapas turísticos que, quando recortados, embaralham as fronteiras entre margem e centro, criando outras vizinhanças possíveis para uma cidade fraturada e fechada em si mesma. “Esse trabalho em torno da ideia de fronteira e regiões delimitadas começa em 2017 através de uma pesquisa que fiz sobre o ônibus Grande Circular. Passei a olhar para a cidade através de uma linha de ônibus que circulava na margem. Mas no Mapa Turístico a margem pouco aparece porque não interessa ao turista. Então coloquei as margens juntas, criticando a cidade que sempre vende os mesmos roteiros e criando um mapa com uma estrutura social e de vizinhança imaginária”, adianta o artista.

ANUNCIAÇÃO: VOU TE OLHAR NO VAZIO IMENSO
Curadoria: Clébson Francisco
Artistas: Antonio Breno, biarritzzz, Bruno Gadelha, Camila Fontenele, Ella
Monstra, Mike Dutra, Rodrigo Lopes, Tamires Ferreira

MANDINGUEIRA
Artista: Pedra Silva
Curadoria: Eduardo Bruno

O PAPEL DO PAPEL
Artista: Samuel Tomé
Curadoria: Renata Felinto
Curador Assistente: Jorge Silvestre

Serviço

Exposições “Anunciação: vou te olhar no vazio imenso”, “Mandingueira” e “O papel do papel”
Em cartaz no Museu de Arte Contemporânea do Ceará, no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, até 17/03/25.
Acesso gratuito, com visitação de quarta a sexta, das 9h às 18h, e aos sábados, domingos e feriados, das 13h às 18h, sempre com último acesso até as 17h30.

Por Ascom Dragão do Mar

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