Sakamoto: Fala de Bolsonaro envelhece mal após agressão a brasileiros deportados

‘Os voos de deportação começaram’, publicou a nova Secretária de Imprensa da Casa Branca, Karoline Leavitt – Foto: Secretária de Imprensa da Casa Branca, Karoline Leavitt/via X

Por Leonardo Sakamoto, no UOL

Diante de denúncias de maus tratos de agentes de segurança do governo dos Estados Unidos contra brasileiros deportados, neste sábado (25), envelheceu mal a recente declaração do ex-presidente Jair Bolsonaro defendendo a promessa de Donald Trump de expulsar milhões de migrantes que estão de forma irregular no país. O Ministério das Relações Exteriores vai pedir explicações ao governo Trump sobre o tratamento degradante dispensado aos brasileiros no voo.

“Ele está fazendo a coisa certa. Foi compromisso de campanha”, disse em entrevista à CNN na última quinta (23), ao elogiar a política adotada por Trump. “Acho que ele está fazendo o que prometeu, e no lugar dele eu faria a mesma coisa”, completou.

Os relatos e imagens de agressões físicas e verbais durante o voo de repatriação lembram que o processo de deportação não é como um passeio no parque. Inclui detenções por meses e tratamento desumano a migrantes indocumentados – que produzem riqueza, pagam impostos através do consumo e assumem funções que a maioria dos cidadãos norte-americanos não quer.

Uma das máximas da diplomacia é que países não têm amigos, mas interesses, e o principal deles deveria ser sempre o bem-estar de seus cidadãos.

Que Trump defenda o que ele diz ser o interesse de seus cidadãos faz parte do papel que está interpretando. Ressalte-se que esse papel bate de frente com todas o princípio da dignidade humana e que ele foi ele um dos responsáveis por fomentar xenofobia nos EUA com a demonização de migrantes, generalizando que eles são estupradores e ladrões que fugiram das prisões de seus países e que roubavam gatos e cachorros para comer.

Mas quando Bolsonaro defende uma política estrangeira que acaba batendo de frente com a dignidade de brasileiros, aí é outra coisa. Isso pode fazer sentido com uma parte do eleitorado daqui que se autoproclama “patriota”, mas vive enrolada com a bandeira de outro país. Contudo, pega mal para muita gente.

O ex-presidente Jair Bolsonaro – Foto: Reprodução

Suas declarações de apoio à violenta política de Trump de deportação de migrantes não são novas. Por exemplo, em entrevista à Fox News, em 19 de março de 2019, disse que “a grande maioria dos imigrantes em potencial não tem boas intenções nem quer o melhor ou fazer bem ao povo americano”.

Considerando que são muitos os brasileiros entre os que migram para os EUA e, mais do isso, que tanto os Estados Unidos quanto o Brasil são países que se constituíram por migrações (forçadas e espontâneas) de pessoas de várias partes do mundo, o então presidente brasileiro conseguiu insultar sua própria gente em uma TV estrangeira.

“A grande maioria dos imigrantes” tem sim boas intenções e faz o bem ao povo que os acolhe. São eles que exercem o trabalho sujo que poucos querem fazer, limpam latrinas, costuram roupas, cozinham e servem, recolhem o lixo, limpam as ruas, constroem casas.

Expulsos pela falta de emprego ou pela violência, brasileiros como outros latino-americanos entram e se estabelecem de forma irregular nos EUA. Não querem infringir a lei, mas guiados pela propaganda de que lá ainda é a terra da oportunidade, buscam uma vida melhor.

Políticos brasileiros deveriam defender a dignidade de seus conterrâneos e não as políticas migratórias de outro Estado.

Desde sua campanha eleitoral de 2016, Donald Trump culpa os migrantes pobres por desgraças que acontecem em solo norte-americano – de estupros ao tráfico de drogas e principalmente o terrorismo. Chegou a dizer que eles “infestam” o país e os chamou de o “mal”.

Dobrou a aposta na campanha do ano passando, associando-os a tudo o que não presta e prometendo expulsar milhões. O que, ironicamente, vai afetar a economia pelo impacto na mão de obra e custar bilhões.

Vale lembrar, contudo, que a maioria dos atiradores que matam em escolas e igrejas nos Estados Unidos são homens, brancos, héteros, nascidos por lá.

O que políticos brasileiros ganham ao dar declarações que fazem coro com o pior do nacionalismo norte-americano e europeu?

Quando Bolsonaro estava no governo, talvez quisesse se mostrar tão útil que o norte-americano o considerasse um parceiro prioritário. O que não deu lá muito certo porque o Brasil entregou alinhamento automático e, mesmo assim, baixou a cabeça em questões como o aço ou etanol. Hoje, talvez garantir que Trump lembre dele e pressione as instituições brasileiras para cancelar sua inelegibilidade visando a 2026 – apesar de ser mais fácil o tal camelo passar pelo buraco da tal agulha.

Acender a libido da ala radical de seus seguidores em redes sociais. Ganhar um afago ou um biscoito da extrema direita norte-americana e internacional. O problema é que ser subserviente nunca fez com que alguém ganhasse respeito. Pelo contrário.

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