O cenário da arte contemporânea brasileira vive uma transformação significativa com a ascensão de artistas indígenas que vêm ocupando instituições, premiações e exposições de grande relevância. Parte dessa virada está refletida nas edições mais recentes do Prêmio PIPA, uma das principais premiações das artes visuais no país.
Entre os artistas indígenas indicados ou premiados em 2025, 2024 e 2023, estão nomes de diversas etnias, territórios e linguagens, com práticas que mesclam tradição, crítica social e um forte componente de resistência cultural.
A seguir, apresentamos os artistas indígenas em destaque dessa cena, com base nas informações disponibilizadas pelo Instituto PIPA e nos próprios artistas.
Juliana Xukuru (Pernambuco, PE, 1991)
Juliana Xukuru tem como centro de sua produção o pertencimento ao povo Xukuru de Pernambuco e a busca por narrativas que conectem a ancestralidade, o feminino e a infância. Sua singularidade está na forma como constrói imagens a partir de vestígios e memórias, com forte base no pensamento decolonial. Mais do que uma escolha teórica, a decolonialidade surge como metodologia viva em seu fazer artístico. Juliana atua conectada à sua comunidade, que se reconhece em sua trajetória, e às mulheres de seu entorno, que ocupam espaço central em suas investigações.
Sendo assim, a obra já foi apresentada em espaços como o Itaú Cultural e o Museu de Arte Moderna de São Paulo. Realizou residência, por exemplo, na Galerie Paradise, na França, e foi indicada ao Prêmio PIPA 2025. A artista também participa do Levante Nacional Trovoa, coletivo de artistas racializadas, o que reforça o caráter político e coletivo de sua atuação.
Isaias Miliano (Roraima, RR, 1971)
Escultor e artista visual, Isaias Miliano transforma madeira descartada em peças que conectam arte rupestre, design gráfico e a mitologia de Roraima. Nascido em Uiramutã (RR), carrega influências do povo Patamona, com quem aprendeu o valor da ancestralidade e da preservação ambiental. Sua obra singular emerge do gesto de coletar o que seria lixo e ressignificá-lo como expressão visual e memória ancestral.
Miliano produz baixos e altos relevos que evocam lendas da Amazônia e paisagens culturais de seu território. Participou de exposições como “Moquém_Surarî”, no MAM-SP, e teve obra premiada no Prêmio Anísio Fernandes. Em 2025, está indicado ao Prêmio PIPA. Assim, a trajetória é marcada pela crença de que o artista tem a responsabilidade de modificar positivamente o ambiente ao seu redor.
Aislan Pankararu (Pernambuco, PE, 1990)
Formado em Medicina, Aislan Pankararu abandonou o jaleco para se entregar à arte como forma de reconexão com sua ancestralidade. Em suas pinturas e instalações, ele utiliza traços inspirados na pintura corporal tradicional dos Pankararu. A matéria de suas obras vem da caatinga, da memória e dos rituais de seu povo. O que torna sua obra singular é essa intersecção entre o tradicional e o contemporâneo, com uma expressividade que nasce do reencontro com suas origens.
Aislan já expôs em Londres, Nova York e em museus como o MASP e o Itaú Cultural. Foi premiado no PIPA 2024. Sua trajetória se consolida como uma das mais potentes da arte indígena contemporânea.
Cleiber Bane Huni Kuin (Acre, AC, 1983)
Membro do MAHKU (Movimento dos Artistas Huni Kuin), Cleiber Bane transforma cantos rituais em imagens. Sua obra nasce da transcrição visual das músicas tradicionais do povo Huni Kuin, especialmente aquelas que envolvem o Nixi Pae. Com isso, suas pinturas funcionam como livros visuais de saberes ancestrais.
A singularidade do artista está na relação entre arte e espiritualidade. Desde 2009, Bane vem transcrevendo os huni meka em desenhos, orientado por seu pai, Ibã Sales. Participou de exposições na Fondation Cartier e no MASP. Sua prática contribui para a consolidação territorial dos Huni Kuin por meio da arte.
Rita Huni Kuin (Acre, AC, 1994)
Rita é pintora autodidata, pedagoga e mãe. Possui uma arte é moldada pelas mitologias, cantos e rezos do povo Huni Kuin. O diferencial da produção está na forma como articula conhecimento ancestral, empoderamento feminino e educação.
Co-fundadora do Grupo Kayatibu, Rita realiza uma arte que nasce da floresta e volta para ela como ato político e espiritual. Produziu, junto ao grupo, o projeto “Floresta Futuro”, que resultou em um álbum visual com 17 clipes. Sua obra é uma ponte entre gerações e territórios.
Ziel Karapotó (Alagoas, AL, 1994)
Multiartista, Ziel atua no cruzamento entre artes visuais, performance, cinema e curadoria. Originário da comunidade Karapotó Terra Nova (AL), sua arte emerge da resistência em contextos urbanos e acadêmicos. Suas obras abordam violências coloniais e celebram a potência ancestral.
Ziel levou a obra “Cardume II” à Bienal de Veneza em 2024 e venceu prêmios com seu curta “O verbo de fez carne”. Atua na articulação de redes e acredita na arte como força anticolonial. Sua prática amplia o repertório da arte indígena nordestina.
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Yaka Huni Kuin (Acre, AC, 1996)
Artista visual e aprendiz da floresta, Yaka nasceu na Aldeia Chico Curumim, no Acre. Sua arte é marcada pela cosmovisão Huni Kuin, as mirações com o Nixi Pae e os cantos tradicionais de seu povo.
Trabalha com pintura, padrões gráficos (kene), artesanato e música. O que distingue sua produção é a busca por expressar a força feminina da floresta. Em 2023, participou da Bienal de São Paulo e da COP28, em Dubai, onde sua obra integrou um jantar imersivo sobre a Amazônia.
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Yacunã Tuxá (Pernambuco, PE, 1993)
Filha do povo Tuxá de Rodelas (BA), Yacunã nasceu em Floresta (PE). Ela se define como “filha da terra”, nome que recebeu através da arte e dos Encantados. Sua prática é marcada pela combinação de linguagens: pintura, barro, escrita e curadoria.
No PIPA Online 2024, foi a artista mais votada. Sua obra aborda identidade, ancestralidade e território, com foco na visibilidade de mulheres indígenas do Nordeste. Seu trabalho é uma flecha lançada contra o apagamento histórico.
Xadalu Tupã Jekupé (Rio Grande do Sul, RS, 1985)
Guarani do pampa gaúcho, Xadalu pesquisa as marcas da catequização e a presença dos povos originários nas cidades. Trabalha com serigrafia, objetos e fotografias. Sua arte confronta a urbanização colonial e propõe outras cartografias para os territórios indígenas. Participante do Prêmio PIPA 2022 e 2024.
Com obras em acervos como o do MAM-SP e do Museu Nacional de Belas Artes, Xadalu participou da Bienal das Amazônias e expõe em 2025 na Casa de América, em Madri. Sua pesquisa propõe uma presença viva e insurgente da cosmologia guarani nas metápoles.

Daiara Tukano (São Paulo, SP, 1982)
Artista, ativista e educadora, Daiara é do povo Tukano do Alto Rio Negro. Em sua produção, une pintura mural, performances e intervenções urbanas a saberes espirituais e tradições orais.
Foi coordenadora da Rádio Yandê e venceu o PIPA Online 2021. Participou de mostras no MASP, no Theatro Municipal de SP, e em Londres. Seu trabalho mais recente articula arte e direitos humanos, em uma política visual de memória e existência coletiva.
Glicéria Tupinambá (Bahia, BA, 1982)
Liderança política, mestranda em antropologia e artista premiada, Glicéria atua desde a aldeia Serra do Padeiro (BA). Sua arte documenta e denuncia violências, mas também celebra saberes e resistências.
Vencedora da Bolsa ZUM/IMS com o projeto “Nós somos pássaros que andam”. Curou a exposição sobre o manto Tupinambá e atua junto à ONU Mulheres. Sua prática integra arte, política e espiritualidade em defesa dos direitos dos povos originários.
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