Opinião: Rumo ao Desconhecido: A Vontade de Saber como Força Civilizadora Por Élcio Batista, Cientista Social, Professor e Líder em Inovação. Coordenador do Programa Cidade +2°C do Centro de Estudos das Cidades | Laboratório Arq.Futuro | Insper

Há algo de profundamente humano na combinação entre curiosidade e obstinação. O documentário sobre o telescópio James Webb — que levou 25 anos, mobilizou 10 mil pessoas e consumiu 10 bilhões de dólares — não é apenas um feito da engenharia moderna. É, sobretudo, uma epifania sobre o que somos: criaturas que olham para o céu não apenas para se orientar, mas para compreender. Não apenas para medir distâncias, mas para sonhar com significados. E não apenas para ver estrelas, mas para tocar, com o pensamento, o instante primordial em que o nada se fez tudo.

A construção desse telescópio é, paradoxalmente, um espelho. Um artefato lançado para os confins do universo, mas que devolve a nós, em cada imagem captada, o reflexo da nossa inquietação. Queremos saber como tudo começou — o universo, o tempo, a matéria, nós mesmos. Mas, ao fazer isso, também buscamos o que pode vir a ser. A ciência, nesse sentido, é um exercício de retorno: quanto mais avançamos em direção ao futuro, mais perto chegamos do passado absoluto. É como se, ao esticarmos a mão em direção às galáxias distantes, estivéssemos tateando o ventre do tempo.

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Senti algo semelhante ao estar diante das pirâmides do Egito. Pedras de dezenas de toneladas, arrastadas por quilômetros, erguidas com precisão milimétrica — e tudo isso há mais de quatro mil anos. Como explicar tal façanha? A resposta não é apenas técnica. Ela exige outra categoria: a do espírito humano. A pirâmide é uma forma de eternidade arquitetada. Uma vontade material de transcender o tempo. Como o telescópio James Webb, também ela é um espelho: reflete a obsessão ancestral pela permanência, pela memória e pela ideia de retorno — o retorno do faraó, a continuidade da linhagem, a persistência da glória. Na base, sempre, uma fé no invisível. Uma aposta no além.

Entre pirâmides e telescópios, o que se revela é o mesmo impulso: superar os limites impostos pela época. Não aceitamos os contornos da realidade como definitivos. Insistimos em ir além. Nossos corpos são finitos, mas nossa imaginação é expansiva. Queremos anexar planetas, como disse Cecil Rhodes, não por vaidade imperial, mas porque há em nós uma fome pelo que ainda não foi dito, não foi visto, não foi vivido.

A jornada do conhecimento é isso: uma marcha teimosa contra a ignorância, guiada por lampejos de intuição e assombrada por dúvidas eternas. A ciência não é fria — é febril. E sua motivação última não é utilitária, mas existencial. Não construímos telescópios apenas para medir distâncias, nem pirâmides apenas para honrar mortos. Construímos porque somos movidos pela pergunta sem resposta. Porque, em última instância, saber é viver mais plenamente.

Talvez sejamos, até onde sabemos, a única espécie do universo capaz de contemplar o universo. E talvez seja justamente isso o que nos define: não o que temos, mas o que procuramos. A busca nos torna humanos. E, se tivermos sorte, também eternos.


Élcio Batista é Cientista Social, Professor e Líder em Inovação. Coordenador do Programa Cidade +2°C do Centro de Estudos das Cidades | Laboratório Arq.Futuro | Insper


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Élcio Batista | Foto: divulgação

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