Sakamoto: Dois anos após 8/1, anistia virou fumaça com a tentativa de explodir o STF

Francisco Wanderley Luiz, conhecido como Tiü França, terrorista que se explodiu em frente ao Supremo Tribunal Federal. Foto: Reprodução

Por Leonardo Sakamoto, publicado no UOL

Ao invés de culpar o Supremo Tribunal Federal e o governo federal, bolsonaristas deveriam assumir que eles próprios ajudaram a explodir as chances de anistiar tanto os executores do 8 de janeiro de 2023 quanto os arquitetos e financiadores dos planos golpistas que foram postos em prática em outubro de 2022. Explodir, literalmente.

Ao detonar bombas na Praça dos Três Poderes, em Brasília, e depois se explodir na frente do Supremo Tribunal Federal, em 13 de novembro do ano passado, Francisco Wanderley Luiz, vulgo “Tiu França”, um chaveiro catarinense, candidato derrotado à Câmara dos Vereadores de Rio do Sul (SC) pelo PL, mostrou o que acontece quando punições rigorosas não são dadas a quem tenta derrubar a democracia.

Mesmo se, por uma tempestade perfeita, uma anistia ampla, geral e irrestrita for aprovada no Congresso, alguém em sã consciência crê que ela terá sua constitucionalidade validada pelo STF?

Depois dele, outros dois casos de ameaça a Brasília apodreceram o debate sobre a aprovação de uma lei para perdoar quem atacou as sedes dos três poderes em 8 de janeiro de 2023.

Em 29 de dezembro, o corretor de imóveis Lucas Ribeiro Leitão, de Fortaleza, foi preso após ser detido a caminho de Brasília por equipes da Divisão de Proteção e Combate ao Extremismo Violento da Polícia Civil do DF. Ele confessou que planejava um ataque à capital federal. E, um dia antes, o advogado Fabrízio Domingues Ferreira ameaçou explodir as sedes da Polícia Militar e da Polícia Federal no Distrito Federal, e disse que já estaria com as bombas. A PM não encontrou explosivos com ele e apontou que estava em surto psicótico.

Do ponto de vista político, pouco importa se tinham problemas mentais ou se estavam profundamente perturbados. Eles foram inspirados por aqueles que arquitetaram o golpe em 2022 e que permanecem sem punição.

Golpistas no ataque de 8 de janeiro de 2023 em Brasília. Foto: Sérgio Lima/AFP

Pode ser difícil para muitas pessoas visualizarem que a impunidade daqueles que cometeram o golpe de 31 de março de 1964 incentivou uma intentona golpista, quase 60 anos depois, entre outubro de 2022 e janeiro de 2023. Por isso, atentados como o do homem-bomba desenham de forma didática para a sociedade o que a falta de uma resposta dura pela Justiça pode causar.

Desde fevereiro do ano passado, Jair Bolsonaro tem pautado o tema da anistia aos “pobres coitados do 8 de janeiro”. Usando a solidariedade aos seus seguidores como justificativa, defende, na prática, um projeto de lei que pode beneficiá-lo. Tenta convencer que o melhor é um arranjo para não punir ninguém pelos crimes cometidos a fim de “pacificar” o país.

Enquanto bolsonaristas mais radicais continuam defendendo a anistia a todo o custo, para ajudar o ex-presidente, passou de 13% para 37%, entre dezembro de 2023 e de 2024, o total de eleitores de Jair que acreditam que ele influenciou os atos golpistas, segundo pesquisa Genial/Quaest. Já o total dos que não creem nisso passou de 81% para 55% no mesmo período.

Se a divulgação do que foi encontrado pela Polícia Federal durante sua investigação do golpismo ajudou a evitar a natural perda de memória da maioria da população quanto ao 8 de janeiro, a horda de golpistas que continua tentando mandar o STF para os ares impõe um constrangimento a quem defende um grande perdão.

Por mais que extremistas tentem ressignificar o que aconteceu, chamando os golpistas de heróis e se vitimizando, de tempos em tempos, alguns se desgarram do rebanho e tentam novamente aquilo para o qual foram programados. O recalque é suspenso, aparece o desejo censurado. Afinal, o bolsonarismo ensinou que urnas mentem, que o país vive ditadura sob Lula e que se levantar contra isso é revolucionário. Se líderes do golpismo não forem para a cadeia, muita gente vai achar que ainda dá tempo de ser mártir.

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