Inteligência artificial na medicina: entenda avanços, desafios e impacto na saúde

Ilustração sobre a interação com a Inteligência Artificial (Foto: Pexels)

A inteligência artificial (IA) tem a capacidade de transformar a humanidade, em várias áreas da sociedade. Na medicina, por exemplo, a tecnologia permite diagnósticos mais rápidos e precisos, já que consegue analisar grandes volumes de dados para identificar padrões e prever riscos de saúde antes que se tornem críticos. 

A inteligência artificial já é usada para interpretar exames, auxiliar cirurgias e personalizar tratamentos. Sistemas baseados em aprendizado de máquina conseguem analisar exames de imagem, identificar nódulos suspeitos e sugerir condutas clínicas com alta precisão. Além disso, ferramentas automatizadas agilizam a gestão de pacientes, o que ajuda os profissionais a focar na parte clínica. 

Pesquisas acadêmicas estão surgindo há um tempo: no Japão, um grupo de pesquisadores, liderados pelo professor Hideyuki Kobayashi, criou um modelo de IA que prevê o risco de infertilidade masculina com alta precisão. Tudo que é necessário para ter o resultado é um exame de sangue. 

Os resultados mostram uma precisão de até 74% sem precisar fazer análise de sêmen, e foram publicados na revista científica Scientific Reports, em julho de 2024.

Enquanto isso, cientistas da Universidade de Cambridge criaram uma ferramenta que usa IA para prever se um paciente com sintomas iniciais de demência pode progredir para Alzheimer. A pesquisa foi publicada na revista eClinical Medicine.

Mesmo com tudo que a IA pode fazer na medicina – e que às vezes pode parecer um milagre –, ainda há uma série de desafios, como a necessidade de regulamentação e a confiabilidade dos algoritmos.

Detecção precoce e análise de exames

A IA tem sido uma grande aliada na detecção precoce de doenças, em várias especialidades. O cirurgião de cabeça e pescoço Erivelto Volpi, especialista no tratamento das doenças da tireoide e paratireoide, destaca que a tecnologia já aprimora a análise de exames de imagem, como ultrassonografias e ressonâncias magnéticas, tornando a identificação de nódulos suspeitos mais precisa. Além das imagens médicas, a IA também é utilizada na análise de dados clínicos e laboratoriais. 

Segundo Volpi, a tecnologia pode integrar informações de diferentes fontes, como exames hormonais e históricos médicos, para prever a progressão de doenças. 

“A inteligência artificial pode fornecer suporte à decisão clínica ao sugerir possíveis diagnósticos ou tratamentos baseados em dados históricos e evidências científicas. Isso pode ajudar os cirurgiões a planejar procedimentos de forma mais precisa e com mais segurança”, disse.

Na urologia, a IA também tem um papel importante. O uro-oncologista André Berger, cirurgião robótico e coordenador do Núcleo de Robótica do Hospital Moinhos de Vento (HMV), em Porto Alegre (RS), menciona o uso da tecnologia para o planejamento de cirurgias e interpretação de exames de patologia. 

Em um estudo recente, publicado na revista médica Radiology, estudiosos encontraram evidências que a inteligência artificial é capaz de medir o tamanho do tumor em casos de câncer de próstata com alta precisão e ainda ajudar a prever o avanço da doença. 

“Com a inteligência artificial, conseguimos não só diagnosticar o câncer de próstata com maior precisão, mas também planejar um tratamento personalizado que minimize os riscos e maximize a eficácia, especialmente para pacientes em estágio inicial da doença”, disse Berger.

Inteligência artificial clínica

Da mesma forma, a inteligência artificial tem demonstrado grande potencial na detecção precoce de doenças cardiovasculares. 

Marcelo Bergamo, cardiologista, reforça a ideia que a IA pode identificar sinais que, tradicionalmente, seriam difíceis de detectar, especialmente em estágios iniciais, usando um volume muito grande de dados clínicos para identificar padrões e anomalias.

Ele acredita que essa abordagem preventiva será chave para salvar vidas, criando uma medicina mais proativa e menos reativa. Ele exemplifica com a arritmia (fibrilação atrial), que é relativamente comum. 

O cardiologista explica que, normalmente, é feito um exame chamado Holter para identificar a doença, ou às vezes, um Looper, que é um Holter mais prolongado, de alguns dias, às vezes até alguns meses, onde o paciente pode ficar com um dispositivo para tentar detectar essa arritmia. 

“Só que essa arritmia pode ser intermitente: ora o paciente está com ela, ora o paciente não está com ela”, ele destaca. Por conta disso, o paciente pode passar um tempo muito maior sem nenhuma arritmia. 

Em casos como esse, o Holter associado a uma inteligência artificial será capaz de fazer os cálculos estatísticos e matemáticos que vai predizer qual é o risco daquele paciente desenvolver a fibrilação atrial ou de estar desenvolvendo fibrilação atrial. 

“O grande problema dessa arritmia é o risco de ter um AVC, um derrame e todas as consequências. Então, se você conseguir detectar precocemente esse problema e tratar esse paciente da forma adequada, com a medicação, o anticoagulante adequado, você consegue prevenir um desfecho desfavorável em relação a essa arritmia nesse tipo de paciente.”

— Marcelo Bergamo, cardiologista

Cirurgia robótica e monitoramento de pacientes

Outro avanço significativo proporcionado pela IA é a cirurgia assistida por robôs, que vem ganhando espaço na prática médica. Berger explica que a tecnologia pode ajudar a prevenir complicações e melhorar a formação de novos cirurgiões. 

“A IA na cirurgia robótica identifica áreas de risco e até orienta cirurgiões durante a formação com exercícios específicos para melhorar o treinamento na simulação cirúrgica”, disse.

No pós-operatório, o monitoramento de pacientes também tem sido aprimorado com o uso de inteligência artificial. Dispositivos wearables e sistemas de acompanhamento remoto ajudam a prever eventos adversos e garantem um acompanhamento mais eficiente. 

“Temos uma iniciativa muito interessante para acompanhar pacientes no pós-operatório de cirurgias grandes, como a remoção da bexiga e reconstrução urinária devido ao câncer de bexiga”, ressalta Berger.

Benefícios e desafios da inteligência artificial na medicina

A IA tem se mostrado uma ferramenta poderosa para otimizar o tempo dos médicos e melhorar a precisão dos diagnósticos. 

Berger relata sua experiência com o sistema OneLine, que automatiza a parte pré-consulta, com perguntas gerais de história médica e o motivo da visita. 

“Quando o paciente chega, a anamnese está praticamente pronta, inclusive com sugestões de conduta baseadas em guidelines médicos. Isso aumenta o tempo de interação médico-paciente e estrutura melhor a documentação médica”, explicou.

Berger vê que a utilização da IA na medicina pode trazer impactos diretos na quantidade de vidas salvas, principalmente quando se trata de oncologia. Ele exemplifica que a taxa de sobrevivência de 5 anos para todos os tipos de câncer combinados aumentou de 50% na década de 1970 para cerca de 70% na atualidade, em países desenvolvidos.

Apesar dos avanços, a implementação da inteligência artificial na medicina ainda enfrenta desafios. 

A IA requer grandes volumes de dados de alta qualidade para treinar algoritmos de maneira eficaz. Muitas vezes, os dados disponíveis podem ser limitados, desatualizados ou de qualidade variável, o que pode afetar os resultados.

Além disso, a aceitação da tecnologia pelos profissionais de saúde e pacientes ainda está em evolução.

“Existe alguma expectativa dos pacientes em relação à utilização da inteligência artificial na prática médica, mas essa tecnologia ainda não está totalmente incorporada no nosso meio. Ainda há um longo caminho para que a IA tenha total confiança nos seus resultados”, avalia Volpi.

O cardiologista destaca que essa desconfiança tende a ser uma parcela mais específica da população brasileira. 

“A gente vê muito isso com os pacientes de uma idade mais avançada, com dificuldade de compreensão do que vem a ser essa inteligência artificial e como ela vai poder auxiliar”, disse.

IA como ferramenta, não substituição

Apesar do aumento do uso da inteligência artificial na medicina, ainda é preciso entender questões éticas e regulatórias, especialmente com o tratamento de dados sensíveis dos pacientes. 

Volpi ressalta que a IA deve ser vista como uma ferramenta de suporte à decisão médica, e não como uma substituta do julgamento clínico. 

“A IA deve se aprimorar cada vez mais como uma ferramenta útil na tomada de decisão médica, ajudando no diagnóstico, definição da melhor conduta e no acompanhamento dos pacientes”, disse. “Mas não deverá substituir a experiência, o bom senso e a decisão final sobre o melhor caminho para o tratamento.”

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