José Edward lança o livro “Poemas Vagabundos”

Patrícia Cassese | Editora Assistente

“Poemas Vagabundos” (Inmensa Editorial), livro que o poeta e jornalista José Edward Lima lança no próximo sábado, dia 8 de fevereiro, na Casa da Floresta, reúne 64 poemas, entre alguns publicados originalmente no livro “Pátria Que Pariu!”, de 1989, e inéditos, que despontaram ao longo das últimas duas décadas. A lavra compõem as 100 páginas da obra, dividida em três seções – PoemAIS, PoeméDIOS e POEmínimos –, cujos nortes o autor contextualizou para o Culturadoria. “A divisão tem, sim, a ver com o tamanho dos poemas. Mas não só. Por exemplo: na seção PoemAIS, destaco, propositalmente, as três últimas letras pelo fato de os poemas que a compõem terem, quase todos, o propósito de ‘colocar os pingos nos AIS da Pátria’, como está literalmente escrito em ‘Ato Palho’ – que, aliás, é um poemeto, com apenas cinco versos”.

É nesta seção que estão republicados alguns poemas do já citado “Pátria Que Pariu!”, relançado em 2007, pela Editora Autêntica. São escritos que, salienta ele, colocam (“de forma poética, mas cáustica”) o dedo na ferida. Que, arremata, são “insepultas mazelas sociais, econômicas e políticas que assolam desde sempre uma patriamada que nem sempre foi/é gentil com toda a gente que a ama”.

PoeméDios

Já a seção PoeméDIOS traz poemas que Edward caracteriza como “de estatura mediana”, numa referência à “Lero-Lero”, poema de Cacaso musicado por Edu Lobo. “Aqui, não estamos falando de mediocridade, mas de ‘ter um sentimento médio’ das inquietudes que assombram toda e qualquer pessoa, independentemente do gênero, da raça ou da classe social”. Ele se refere a sentimentos e atitudes como paixão, amor, amargura, medo, esperança, tristeza, alegria, ousadia, covardia, (de)ilusão. “E tudo mais que é inerente à condição humana”.

Tal ambiguidade, assinala, está “clara e evidente” no poema “Dial-ética”, que reproduzimos a seguir

Súbito, a vida fica amarga dura vazia escura / qual noite de lua cheia, com seus pesadelos e assombrações / Uma dor em forma de cruz / Com fé, ela volta a ser doce macia clara / E brilha como um sol ao meio-dia / com seus sonhos cheios de encantos / Uma flor em forma de luz.

POEmínimos

A seção POEmínimos, por sua vez, é composta por pensatas poéticas, que, especifica José Edward, estão sintetizadas majoritariamente em um único verso. “São ideias jogadas ao léu, para expressar, por exemplo, que ‘super homens são de mentira’. Ou que ‘mulheres maravilha viram ilhas’. Do mesmo modo, que ‘o universo cabe inteiro num verso, numa linha’, e que ‘no caminho da poesia não há o fim da linha’”.

‘Página infeliz da nossa história’

No cômputo geral, José Edward revela que não houve uma premeditação com relação à quantidade de poemas que comporiam o livro. “Mas não deixa de ser significativo o fato de que, no final das contas, depois de muitas idas, vindas e ‘escolhas de Sofia’, tenham sido selecionados exatamente 64 – um número cabalístico, que nos remete a uma ‘página infeliz da nossa história’, como bem versejou Chico Buarque, na épica canção ‘Vai Passar’”.

“Isto porque alguns dos meus poemas vagabundos defenestram aquele tempo sinistro, que, incompreensivelmente, ainda é considerado por muitos como um tempo bonito”.

É o caso, por exemplo, de “Lei da Selva”. “Nele, vocifero o seguinte: a lei que aqui se ditava era dura / era dente por dante (um inferno!) / era olho por alho (e como ardia!) / hoje é apenas uma lembrança triste e vazia (mas como ainda DOI CODI!)“. Edward confessa que uma esperança que recentemente se acendeu tem a ver com o que chama de “bons ventos” trazidos pelo sucesso do filme “Ainda estamos aqui”, de Walter Salles. “Que eles (ventos) ajudem a refrescar a memória de gente antiga e a conscientizar as novas gerações sobre o horror daqueles tempos malditos. Evitando, assim, que o Brasil se transforme novamente em um ‘sanatório geral´ – o que, apesar dos pesares, não está de todo descartado”.

Outros temas e abordagens

Além da política (no sentido stricto), os poemas de José Edward trazem referência a outros episódios trágicos da história recente do Brasil, como o rompimento de barragens, a pandemia da Covid-19 ou o incêndio na boite Kiss… Perguntado sobre o papel da poesia ao abordar temas tão áridos, ele reflete que, a seu ver, há uma crença (“pueril e rasa, na cabeça de muita gente”) de que poesia é uma coisa etérea. “Que paira acima dos reles mortais, que precisa sempre de uma dose de transcendentalismo, de metafísica, para ser arte – quando não se transforma em um mero exercício de brincar com as palavras”.

“Nódoa no brim”

José Edward pontua que respeita quem pensa (e escreve) assim. Mas sustenta: “Me filio a outra vertente. A de Manuel Bandeira, por exemplo, para quem ‘o poema deve ser como a nódoa no brim: fazer o leitor satisfeito de si dar o desespero’. Ou de Fausto Wolff, que no prefácio do meu livro ‘Pátria Que Pariu!’, agora republicado na forma de posfácio, defende que ‘a poesia não foi feita para enfeitar a vida, mas para iluminá-la’. E que ‘o artista/poeta não precisa ser necessariamente um bufão nas horas inúteis, até porque não existem horas inúteis’”.

Portanto, acrescenta, é com esse sentimento que compõe a maior parte dos meus poemas. “Tento, com meus versos, fazer uma conexão direta com a realidade, sem subterfúgios ou ‘papas na língua’”. Aliás, daí o título de “Poemas Vagabundos”. “Como defino em uma das cinco estrofes do poema ‘Pois é Poesia – Nau(sea)’

‘Minha poesia é iracunda / com rompantes de valentia / usa e abusa de bravatas / no limite da verborragia / tem rima torta e teor panfletário / e uma vã crença de que irá um dia / despertar a ira de um patriota / no apático leitor imaginário’.

Não por acaso, José Edward colocou, como epígrafe deste poema, o verso ‘o poeta é a pimenta do planeta’, retirado do poema “Assaltaram a gramática”, de Waly Salomão. “Nele, o intenso e saudoso poeta também apregoa, como eu, que é preciso ‘meter poesia na bagunça do dia a dia’”.

Carro-chefe

Entre os poemas, José Edward desta “Pátria Que Pariu!”, que, lembra, já está na terceira versão. “A primeira foi publicada em 1989, no período da primeira eleição direta para Presidente da República, quando eu, com parcos 24 anos, era um empedernido e entusiasmado militante em prol da redemocratização do país. Naquela época, este meu poema e outros tantos funcionaram quase como panfletos apologéticos de um novo tempo que se prenunciava, mas que fora frustrado pela eleição de um pretenso ‘caçador de marajás’. Que, pouco tempo depois, se tornaria um ‘marajá cassado’, em função de seus muitos malfeitos”.

A segunda versão foi lançada em 2007, em meio às denúncias do “Mensalão”. A terceira, publicada agora, é, diz ele, basicamente a mesma da segunda. “Tendo em comum, com as anteriores, a seguinte epígrafe, extraída da obra ‘Aos Trancos e Barrancos – como o Brasil deu no que deu’, de Darcy Ribeiro, que resume bem a temática do poema. ‘Não me consolo de constatar todo dia que o Brasil não deu certo. Ainda não deu certo. Não por culpa da terra, que é boa; nem do povo, que é ótimo; mas das nossas classes dirigentes, tão tenazmente tacanhas, que só sabem gastar gente a fim de lucrar e enricar’”.

Outros poemas

Outro poema emblemático, explana é o já citado “Pois é Poesia – Nau(sea)”, por meio do qual ele desfere o que chama de “petardos poéticos” contra heranças malditas e a incúria de governantes (“de diversas matizes, credos e instâncias”) com relação a tragédias ocorridas de forma recorrente no país ao longo das últimas décadas. “Este poema foi construído ao longo de vários anos e, neste tempo, seus versículos tiveram que ser revisitados para contemplar novos episódios trágicos”.

Ele se refere ao incêndio da Boate Kiss, aos rompimentos das barragens de Mariana e Brumadinho e à pandemia. “A famigerada Covid-19, que, no Brasil, ceifou a vida de mais de 700 mil brasileiros”.

“Internetudo”

Em outra vertente, José Edward cita o poema “Internetudo”, que, entende, faz uma reflexão acerca do “insondável mundo novo que nasceu de um cibernético bit bang”. “Ele chama atenção para o fato de que ‘há um link entre nós / que nos une e nos separa/ que não ata nem desata / que nos conecta com o mundo e nos afasta / do mais profundo do nosso ser’ . Uma curiosidade acerca deste poema, prossegue ele, é que, na publicação original, há cerca de duas décadas, palavras e expressões como memes, influencers, emojis e (“vejam só!”) fake news não constavam dos dicionários.

“Isso apesar de, pelo menos neste último caso, já existirem na prática, de forma mais ou menos dissimulada. Tive, então, que revisitar o poema para incorporar os novos termos – todos eles estrangeirados, diga-se”, ironiza. Por fim, José Edward destaca o poema “Now Sem Rumo” que, a seu ver, é o que tem uma dimensão mais concretista. “No qual não apenas o conteúdo, mas também a forma, expressa o sentido. Cada verso nele foi cuidadosamente lapidado, como um mineral, até que o poema tivesse a forma de um ponto de exclamação, destacando alguns dos meus referenciais mineirianos”.

Escritos

No universo das Letras propriamente ditas, José Edward diz ser a poesia a sua praia. Mas sim, já expressou suas percepções também em outros gêneros, como no livro-reportagem “Artesão de Sons – Vida e Obra do Mestre Zé Côco do Riachão”, publicado no final da década de 1980. Nessa obra, conta, além da biografia do artista mineiro, publicou reflexões suas e de outros autores sobre a importância da preservação e da difusão da cultura popular.

Mais recentemente, em 2022, ano do bicentenário da Independência do Brasil, teve uma experiência que analisa como “muito rica e gratificante”, como editor de um livro com reflexões “sobre o Brasil que fomos, somos e poderemos vir a ser”. “Assim, fui responsável por transformar, em artigos, palestras de 20 importantes pensadores brasileiros nas seguintes áreas: política, economia educação, tecnologia e desenvolvimento social”. A obra contou com a curadoria do escritor e professor Cristovam Buarque. “A meu ver, um dos mais instigantes intelectuais brasileiros contemporâneos”.

Atualmente, José Edward está escrevendo um livro sobre as vicissitudes do processo de redemocratização do Brasil, que pretende lançar em 2026.

Em tempo

A programação do lançamento do livro de José inclui um sarau, a partir das 18h, no qual poetas e atores irão declamar alguns dos poemas que compõem a publicação. Estão confirmadas as participações presenciais de Alexandre Toledo, Ana Gusmão, Anelito de Oliveira, Helena Affonso, João Diniz, Murilo Antunes, Osmir Camilo e Sidneia Simões. Os poetas Aroldo Pereira e Tadeu Martins participarão, virtualmente.

Infame Ruído

“Poemas Vagabundos” integra a coleção  Infame Ruído, que reúne obras de 25 poetas contemporâneos, sendo 18 brasileiros e sete africanos. Neste último caso, dos seguintes países: Angola, Cabo Verde, Guiné Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe. Parte da tiragem de todos os livros da coleção está sendo doada a bibliotecas de escolas dos 25 municípios com menor IDH de Minas Gerais, numa iniciativa do Instituto de Desenvolvimento Humano Daghobé.

Serviço

Lançamento do livro “Poemas Vagabundos”, de José Edward Lima

Quando. Sábado, 8 de fevereiro, das 16 às 21h.

Onde. Casa da Floresta (R. Silva Ortiz, 78 – Floresta)

Quanto. O evento é gratuito. O livro estará à venda na ocasião.

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