Estrangeiros voltam ao Brasil após caos fiscal. Alívio ou ilusão?

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Gestores de fundos estão voltando a investir em ativos brasileiros, apostando em títulos corporativos em dólar de empresas como Raízen (RAIZ4) e Usiminas (USIM5), após um forte movimento de venda impulsionado por preocupações com os planos de gastos do governo.

Os títulos corporativos brasileiros em dólar ofereceram um retorno de 2,2% desde o início do ano, cerca do dobro da média dos títulos corporativos de mercados emergentes no mesmo período.

Os ativos locais também vêm se beneficiando de um alívio recente, já que o presidente dos EUA, Donald Trump, tem direcionado sua atenção para outras economias emergentes. O real valorizou quase 8% neste ano, tornando-se a moeda de melhor desempenho entre as principais divisas globais, segundo dados da Bloomberg. Isso ajudou a impulsionar um rali de 13% nas ações locais em termos de dólar. Além disso, várias empresas brasileiras voltaram a captar no mercado de dívida, incluindo Embraer (EMBR3), Ambipar (AMBP3) e JBS (JBSS3).

Alívio após turbulência

Esse movimento marca um forte contraste com o final de 2024, quando os mercados financeiros brasileiros despencaram diante das dúvidas sobre o compromisso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com a austeridade fiscal. A venda generalizada levou o real a uma mínima recorde e impactou ações, títulos locais e títulos corporativos em dólar.

“Ainda que preocupações persistam, o Brasil está menos no radar de Trump, e o risco de uma escalada comercial com os EUA parece relativamente modesto, o que deve beneficiar os títulos corporativos”, afirmou Sergey Dergachev, chefe de dívida corporativa de mercados emergentes da Union Investment Privatfonds GmbH.

Contudo, os investidores ainda estão atentos aos impactos das altas taxas de juros, especialmente para empresas mais alavancadas. Segundo Mauro Favini, gestor sênior de portfólio da Vanguard, os investidores estão priorizando empresas com flexibilidade financeira e equipes de gestão experientes, como Raízen SA e Usinas Siderúrgicas de Minas Gerais SA (Usiminas).

Juros altos e desafios fiscais

A taxa de juros no Brasil deve atingir 15%, o maior nível em quase duas décadas. O Banco Central prevê que a inflação permanecerá acima da meta de 3% nos próximos meses, impulsionada pelo aumento dos preços dos alimentos e dos serviços, o que exige uma política monetária mais rígida.

“Existem oportunidades nos títulos corporativos brasileiros, mas é preciso estar confortável com a exposição a taxas de juros elevadas e a uma provável desaceleração da economia”, disse Favini.

Os investidores estrangeiros ainda preferem títulos corporativos em dólar, já que o mercado local de dívida continua dominando por investidores domésticos. Diferenças nas leis de falência, regulação tributária e riscos cambiais afastam os investidores internacionais do mercado interno.

Melhor relação risco-retorno

Desde dezembro, a relação risco-retorno para investimentos no Brasil melhorou, segundo Dimitry Griko, diretor de investimentos da Arkaim Advisors. Ele destacou que sua gestora tem focado em empresas menos expostas à desvalorização cambial ou a riscos relacionados à demanda doméstica, preferindo empresas exportadoras ou com receitas atreladas ao dólar.

O fundo Arkaim Emerging Markets Corporate High Yield Debt superou 99% dos seus pares nos últimos um, três e cinco anos, segundo dados compilados pela Bloomberg. Griko não comentou sobre investimentos específicos.

As políticas comerciais de Trump estão criando uma nova divisão entre as economias emergentes, com os países mais dependentes de exportações sendo vistos como mais vulneráveis às tarifas. As exportações do Brasil para os EUA representaram 12,8% das vendas totais do país em janeiro de 2025, enquanto as vendas para a China foram de 21,7%, segundo o Ministério do Comércio Exterior.

Segundo Jennifer Gorgoll, gestora de dívida corporativa de mercados emergentes na Neuberger Berman, as empresas brasileiras exportam globalmente, minimizando o impacto de tarifas dos EUA. Ela também destacou que frigoríficos brasileiros já possuem operações significativas nos Estados Unidos.

“Há alguma proteção contra tarifas, mas a maior preocupação ainda é com Lula e a situação fiscal do Brasil”, disse Gorgoll, acrescentando que a gestora aumentou discretamente sua exposição a títulos corporativos brasileiros com bons fundamentos após a liquidação de dezembro.

Preocupações fiscais continuam

Apesar da recente recuperação, os investidores seguem céticos quanto ao compromisso de Lula com o controle dos gastos públicos. O Brasil encerrou 2024 com um déficit nominal de R$ 998 bilhões, equivalente a 8,45% do PIB, uma leve melhora em relação aos 8,84% do PIB registrados em 2023.

Os títulos brasileiros podem oferecer valor em comparação a outros mercados emergentes, caso os investidores voltem a se sentir mais confortáveis com a situação fiscal, segundo Guido Chamorro, co-chefe de dívida emergente na Pictet Asset Management Ltd..

“O mercado começou a precificar um alívio fiscal em janeiro, e os ativos brasileiros reagiram positivamente, mas o fiscal ainda é um problema central”, disse Chamorro.

© 2025 Bloomberg L.P.

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