Em noite de emoção, Conceição Evaristo toma posse na AML

A escritora Conceição Evaristo é a mais nova imortal da Academia Mineira de Letras, onde tomou posse nesta sexta-feira, 8, Dia Internacional da Mulher

A data não poderia ser mais emblemática: 8 de março, Dia Internacional da Mulher. Neste 2024, uma sexta-feira. Pois foi justamente neste dia repleto de significados que a escritora (poeta e ficcionista) Conceição Evaristo tomou posse na Academia Mineira de Letras – no caso, na cadeira de nº 40, que era anteriormente era ocupada pela ensaísta, poeta, romancista e professora Maria José de Queiroz, falecida no ano passado. Pouco antes da posse, uma entrevista coletiva reuniu jornalistas de vários veículos. Enquanto aguardavam a chegada da figura central do evento, as conversas se desenrolavam, até que, súbito, uma grande silêncio se fez quando Conceição Evaristo, maravilhosa, com um vestido vermelho em parte coberto por uma peça branca de renda, adentrou o Palacete Dantas.

A própria reação dos presentes diz muito do carisma, potência e da aura da mineira de Belo Horizonte, radicada desde o final da década de 1970 no Rio de Janeiro. Foi como se o silêncio se impusesse, soberano, diante da visão de uma entidade, de uma rainha. Conceição Evaristo, registre-se, é a décima mulher a integrar o corpo de imortais da Academia Mineira de Letras – a primeira foi Henriqueta Lisboa, em 1963. Confira, a seguir, trechos da entrevista de Evaristo concedida aos jornalistas que cobriram a posse.

Eleição

Conceição Evaristo disse que ter sido eleita pela AML corresponde provavelmente a uma das maiores emoções da vida. “Porque, na verdade, eu estou aqui, hoje, certificando um caminho que seria improvável, e que acabou acontecendo. Então, me traz uma emoção, me traz a minha própria história de vida, a história das mulheres negras. Assim, é um momento de gratidão à vida e à própria MAL, entendido que esse é um lugar que me pertence também.

O que representa

Para Evaristo, a eleição representa inclusive a força da resistência e da competência das mulheres negras. “Desse modo, a força da competência do povo negro. Porque quando se pensa escrevivência (conceito cunhado pela escritora) se pensa no conceito, ou em uma forma de entender, de produzir literatura, de ler literatura, a partir da perspectiva das mulheres negras. Assim, é trazer essa perspectiva, essa discussão, essa nova forma de entender a literatura, que é pensar dados novos para a literatura brasileira. É algo que nos alegra porque também é um sinal, é um diálogo”.

Um diálogo que, prossegue Conceição Evaristo, é, de certa forma, forçado pelos que encontram resistência e olhares de esguelha em certos lugares. “Então, a gente força, e força o tempo todo. As classes populares, as mulheres, indígenas, os gays… Nós forçamos o diálogo, praticamente a gente impõe a nossa voz”. E as conquistas, acrescenta ela, não acontecem de uma hora para outra. “Assim, a primeira vez que eu começo a discutir escrevivência foi na minha dissertação de mestrado, em 1994”.

Atenção aos novos tempos

Conceição Evaristo entende que a Academia – “mas não só, penso que todas as instituições que guardam o saber, que divulgam o saber, como a próprias universidades” -, mais do que nunca, têm que estar abertas para a modificação do tempo, para a transformação do tempo. “Desse modo, quando nós pensamos que a literatura é um discurso que traz uma marca de nacionalidade, que mostra o rosto da nação, é impossível pensar uma casa que visa representar essa literatura não ter uma diversidade. O discurso literário brasileiro, ele não pode ser marcado, ou ser só considerado, a partir da criação de homens, e de homens brancos. A cultura brasileira é uma cultura diversa, acho que o próprio estado de Minas Gerais demonstra essa diversidade”.

Sendo assim, ela enfatiza que pensar em uma cultura ou em uma nação democrática, implica, automaticamente, considerar a diversidade, a representação presente em todas as próprias formas de saber. “Então, a Academia tem que ser aberta, no sentido de acolher essa diversidade brasileira. E eu acho que a AML dá um grande pulo, dá um exemplo muito grande, tem um signo de abertura muito grande na própria eleição do Ailton Krenak. Assim, acho que trazer a própria sabedoria, o epistêmico indígena para dentro de uma casa como a AML, eu acho que é muito esperançoso, muito promissor. E hoje, trazendo uma mulher negra, acho que a AML está sendo exemplar para outras academias, inclusive para ABL, onde o Krenak também já está”.

A percepção de uma menina do Cruzeiro

Nascida na favela do Pindura Saia, situada onde hoje é o bairro Cruzeiro, na Região Centro-sul da capital mineira, Conceição Evaristo falou da personagem central do livro “Beco da Memória”, de sua autoria. “Aquela menina do Cruzeiro, e não há como negar que ela seja um alter ego, ela não sabia a vida que teria, mas, desde cedo, sabia que que ela tinha era muito pouco, que havia algo errado. Mas ela não sabia que um dia poderia receber tanto”.

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