O Papa Francisco deveria renunciar? Por Jim Denison

Papa Francisco, que teve seu quadro de saúde agravado nesta sexta (28). Foto: reprodução

Por Jim Denison, PhD*

Nesta semana, dois altos funcionários do Vaticano visitaram o Papa Francisco no hospital em Roma, onde ele está internado há duas semanas tratando uma pneumonia. O Vaticano afirmou que a visita tinha como objetivo obter a assinatura do pontífice para dar andamento ao processo de canonização de novos santos.

No entanto, o New York Times relata que o encontro ocorreu em sigilo e que os dois oficiais não trabalham diretamente com canonizações. Além disso, há uma coincidência intrigante: há doze anos, o Papa Bento XVI anunciou sua renúncia em uma reunião semelhante de cardeais, onde também se discutia a canonização de santos.

Diante desse contexto, começaram a surgir especulações sobre uma possível renúncia de Francisco.

O biógrafo do papa, que enfatizou não ter conhecimento de seus planos, comentou: “Do jeito que o conheço, Francisco não gostaria que uma condição degenerativa grave se tornasse uma distração para o papado, desviando o foco de sua missão.” E acrescentou: “Para ele, o mais importante é a liberdade.”

O significado da renúncia de um papa

Essa discussão me chamou ainda mais atenção depois que assisti ao filme Dois Papas com minha esposa recentemente.

O longa retrata a amizade crescente entre o Papa Bento XVI e o então cardeal Jorge Bergoglio, que mais tarde se tornaria o Papa Francisco. Em uma cena marcante, Bento XVI revela sua decisão de renunciar, e Bergoglio reage com veemência, afirmando que um papa deve servir até a morte, simbolizando o sofrimento de Cristo. “Jesus desceu da cruz?”, ele questiona.

Não sei se esse diálogo aconteceu de fato, mas ele levanta uma questão que vai além do papado e do papel da Igreja no mundo cristão atual.

Quando líderes religiosos “envelhecem”

Vivemos em uma sociedade movida pelos desejos dos eleitores e consumidores, onde líderes e produtos são apenas meios para um fim. Pessoas permanecem em seus cargos enquanto são consideradas úteis, e produtos são comprados enquanto satisfazem necessidades. Essa visão funcional e transacional influencia inevitavelmente a forma como encaramos a vida.

Historicamente, muitas religiões também seguiram essa lógica: os fiéis faziam oferendas aos deuses esperando algo em troca. Hoje, essa mentalidade se reflete até na maneira como vemos nossos líderes religiosos.

Pastores costumam deixar seus cargos quando já não conseguem pregar ou liderar de maneira eficaz. Ministros de jovens muitas vezes “envelhecem” para a função. Líderes de louvor são avaliados principalmente por sua performance musical.

Dentro dessa lógica, faria sentido que um papa renunciasse quando sua saúde já não permitisse que exercesse sua função plenamente. Em qualquer outro cargo, essa decisão não seria polêmica.

O Papa João Paulo II, morto em 2005. Reprodução

Por que João Paulo II recusou renunciar

O que torna o papado diferente é sua simbologia: ele é o representante de Cristo na Terra, ocupando a “cadeira de Pedro”. E o ato mais poderoso de Cristo foi justamente aquele que, aos olhos do mundo, parecia o mais fraco: sua morte na cruz.

Naquele momento, ninguém via a crucificação como o sacrifício do Filho de Deus para a salvação da humanidade. Se Jesus tivesse medido sua missão pelo critério da eficácia imediata, nunca teria aceitado a cruz.

Seu sofrimento final é o fundamento da nossa esperança ao chegarmos ao fim da vida.

Dessa forma, o sofrimento de um papa nos seus últimos dias pode ser visto como um reflexo do de Cristo. O Papa São João Paulo II enfrentou anos de luta contra o mal de Parkinson, artrite e outras doenças antes de falecer em 2005. Mesmo assim, recusou-se a renunciar, reafirmando a mesma ideia dita pelo Cardeal Bergoglio em Dois Papas: “Cristo não desceu da cruz.”

Ele acreditava que suportar o sofrimento com fidelidade era uma de suas formas mais importantes de servir a Deus e ao mundo.

“Escolhi o caminho da fidelidade”

Não sei se o Papa Francisco renunciará ou não. Mas sei que, para Deus, o verdadeiro sucesso está na obediência, e essa obediência muitas vezes tem um custo alto.

O salmista declarou: “Escolhi o caminho da fidelidade; decidi seguir as tuas ordenanças” (Salmo 119:30). Samuel perguntou: “Acaso o Senhor tem tanto prazer em holocaustos e sacrifícios quanto em que se obedeça à sua palavra?” (1 Samuel 15:22a). E respondeu: “Obedecer é melhor do que sacrificar” (v. 22b).

Servir a Deus nos momentos fáceis não surpreende ninguém. Mas servi-lo em meio a dificuldades e sofrimento chama a atenção do mundo.

Nunca esquecerei uma senhora idosa da primeira igreja que pastoreei. Um AVC a deixou completamente paralisada, e enfermeiras precisavam virá-la de tempos em tempos. Mas, em vez de abandonar a fé, ela se aprofundou ainda mais nela.

Tornou-se uma das intercessoras mais poderosas que já conheci. Quando meu primeiro filho nasceu, fiz questão de levá-lo até ela para receber sua oração. Sua fé inabalável me marcou para sempre.

Um mentor sábio uma vez me disse: “Permaneça fiel à última palavra que ouviu de Deus e esteja aberto à próxima.” Quando vivemos dessa forma, nossa fidelidade ecoa tanto no presente quanto na eternidade.

Essa é a promessa—e o convite—de Deus.

*Jim Denison, PhD, é um teólogo cultural 

Conheça as redes sociais do DCM:
Facebook: https://www.facebook.com/diariodocentrodomundo
Threads: https://www.threads.net/@dcm_on_line

Adicionar aos favoritos o Link permanente.