O CRAD (Centro de Reabilitação Álcool e Drogas) de Timbó, situado no bairro Mulde Alta, no Morro Azul, está sendo investigado pelo Ministério Público de Santa Catarina.
A unidade foi parcialmente interditada pela Vigilância Sanitária por manter pessoas internadas sem o consentimento delas.
Ex-internos contaram ao Misturebas News que no local foram escravizados, humilhados, sofreram diversas agressões e comeram comida estragada durante o tempo em que ficaram internados (leia os relatos aqui).

Diante das denúncias, a equipe de reportagem foi até a comunidade terapêutica conversar com o dono da propriedade, Volney Pereira Gomes.
Volney admitiu que errou ao manter as pessoas impedidas de deixar o local (o que é proibido por lei), mas se defendeu afirmando que fez para o bem delas e com o consentimento das famílias.
Em uma conversa longa, Volney negou uma a uma as denúncias sobre o CRAD. Afirmou que a comunidade é um local de acolhimento e cuidado e que ninguém foi agredido lá dentro.
Como vamos colocar medo em 30, 40 homens se somos 7 funcionários? Isso não existe. […] Se uma pessoa foi agredida por que ela não fugiu para o mato? Por que não chamaram a Vigilância Sanitária quando a inspeção estava aqui? Por que não falaram para o CAPS quando eles vieram aqui visitar? Por que não falaram para o delegado que já veio aqui?
Apesar dos questionamentos de Volney, as inspeções e visitas citadas por ele (Vigilância Sanitária, CAPS e delegado) demoravam a acontecer.
Questionado sobre como um interno faria para denunciar fora dessas visitas esporádicas, Volney e Alex Schunck, (que coordena o local e também conversou com a nossa equipe) afirmaram que isso poderia acontecer durante as videochamadas com as famílias, uma vez por mês, já que visitas presenciais eram proibidas.
Sobre as videochamadas, os ex-internos afirmam que elas eram monitoradas pelo CRAD e encerradas se existisse pedido de ajuda. Também alegam que eram castigados se apelassem às famílias.
O CRAD de Timbó existe há oito anos. Neste período, conforme o proprietário, a Vigilância Sanitária fez pelo menos 8 inspeções e nunca encontrou irregularidades.
Você acha mesmo que se houvesse comida estragada e tudo isso que dizem não teria aparecido nas inspeções?
O centro está no momento com apenas um interno que, segundo Volney, escolheu ficar no local. A interdição impede o recebimento de novas pessoas.
Pelo CRAD, afirma, já passaram de 500 a 800 homens (entre 18 e 59 anos) para tratamento contra a dependência de álcool e drogas.
Volney assegura que a internação acontece sempre a pedido das famílias e o tempo internado varia de 9 meses a um ano.
Ele diz que cobra de R$ 800 a R$ 2,5 mil por mês de cada família e também abre vagas sociais, em que dispensa pagamento.
Sobre dopar os internos, Volney garante que a comunidade não tem estoque de remédios.
Temos um psiquiatra que atende os internos e faz as receitas. É ele quem define os medicamentos, nós só administramos.
Os ex-internos também denunciaram que foram submetidos a trabalho análogo à escravidão, sendo obrigados a carregar sacos de estercos dos cavalos de exposição que são propriedade de Volney, em jornadas excessivas.
Isso nunca aconteceu. Os cavalos que temos aqui são para ecoterapia, que é importante no tratamento. […] Quando precisava de alguém para carregar os sacos de esterco, pedia por voluntários. Então, o serviço não era obrigatório.
Volney tem 60 cavalos, sendo 20 deles premiados. Ele afirma que é pecuarista e tem negócios no Rio Grande do Sul, de onde vem sua renda principal.
Eu montei o CRAD porque também sou um dependente em recuperação. Fui dependente químico durante 24 anos, sendo 11 usando cocaína injetável.
Divergências
A apuração do Misturebas News dá conta de que havia 38 internos no momento da interdição, no dia 31 de março. Volney contesta o número e diz que eram 32.
No dia da operação coordenada pelo MP os internos foram perguntados se queriam permanecer ou ir embora do local.
Segundo Volney, 26 optaram em cruzar o portão de saída e 6 pediram para ficar. Dois teriam concluído o tratamento nos dias seguintes e três saíram depois, restando hoje apenas um.
Volney também nega a acusação de ter abandonado as pessoas nas ruas. A equipe de reportagem apurou que a ordem do MP foi para que o CRAD entrasse em contato com as famílias para liberar as pessoas, mas Volney afirma que essa função era da assistência social de Timbó e não sua.
Mortes
Durante a entrevista, Volney falou ainda sobre duas mortes, uma ocorrida dentro da instituição. Segundo o pecuarista, a vítima chegou à unidade já bastante debilitada devido ao uso excessivo de álcool e teria tido um mau súbito.
Em outra ocasião, um homem teria passado mal e morrido no Hospital Beatriz Ramos.
Ainda segundo Volney, houve uma tentativa de suicídio na unidade de um homem que colocou um cadarço de tênis no pescoço e o amarrou no cano do chuveiro.
Voltar o quanto antes
Volney diz que já entregou todos os documentos solicitados pelos promotores e quer que a comunidade terapêutica – que, segundo ele, está entre as 10 melhores de Santa Catarina – volte a funcionar o quanto antes.
Alex chama as denúncias de “calúnia e difamação”.
Já Volney garante que é tão querido por muitos que passaram pelo CRAD que é até chamado de “pai”.
** Neste link da Agência Nacional de Vigilância Sanitária há mais informações sobre o funcionamento das comunidades terapêuticas.
O post Misturebas News entra no CRAD e ouve dono da comunidade terapêutica sobre denúncias apareceu primeiro em Misturebas News.