“Tarifaço”: Preço na indústria já está menor que imaginávamos, diz CEO da Casas Bahia

Em meio à reestruturação do modo de operar do Grupo Casas Bahia, o CEO Renato Franklin se encontra frente a um cenário macroeconômico que considera, no mínimo, “difícil de prever”. Por isso, embora acredite em um mercado que não cresce em 2025, mesmo com incentivos, evita dar peso demais a elementos fora do seu alcance como gestor.

Tem sido assim nos últimos dois anos, desde que assumiu o cargo. “Foi acertada nossa decisão de fazer movimentos mais duros, para não ter de contar com a melhora do macro – que acabou se confirmando até pior”, disse ao programa InfoMoney Entrevista, lembrando da expectativa – vigente até o ano passado – de que os juros brasileiros cairiam, em vez de subir.

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O que não invalida efeitos reais e já sentidos de um contexto global em transformação – sobre o qual, naturalmente, também nada pode fazer. A nova política de tarifas de importação dos Estados Unidos, por exemplo, parece já dar as caras sobre os preços praticados por alguns segmentos da indústria. “Estamos fazendo preços melhores para o Dia das Mães do que na Black Friday – e por investimento da indústria”, disse. Sua visão é de que o Brasil, menos prejudicado do que outros países pelo “tarifaço”, passa a ser visto como um mercado a explorar por fornecedores e novos entrantes.

Renato Franklin, CEO do Grupo Casas Bahia, concede entrevista ao InfoMoney (Foto: Fabio Luis Teixeira)

Na entrevista, Franklin também comentou sobre a movimentação de acionistas relevantes da companhia, como Rafael Ferri e Michael Klein, que provocaram volatilidade nas ações nas últimas semanas. Ele diz que a gestão é passiva no assunto e ressalta que não enxerga discussões sobre a estratégia adotada até aqui. “Todos os lados acreditam que o maior crescimento está na loja física e no crediário, que a gente tem que arrumar a estrutura de capital. Todo mundo quer lucro mais do que crescimento”.

Veja a entrevista completa no player acima ou confira os principais trechos abaixo:

InfoMoney – Como o cenário macro, com juros altos e guerra tarifária pelo mundo, é lido pela gestão da companhia?

Franklin – Ninguém consegue saber exatamente como vai ser o cenário macro. São muitas variáveis e um contexto global que não é particular nosso. Foi acertada nossa decisão de fazer movimentos mais duros, para não ter de contar com a melhora do macro – que acabou se confirmando até pior. Muita gente falava que estávamos cortando na carne, que com os juros caindo o mercado vem e o efeito de diluição é relevante. Não quis contar com isso e foi certo.

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No segundo semestre de 2024, tivemos um impulso, principalmente na linha branca e móveis, que nos ajudou. Em 2025, a tendência é ter um mercado mais de lado, que não cresce mesmo com incentivos. É difícil prever o que vem pela frente. Tem a complexidade na solução das questões fiscais, tem a discussão tarifária que vai trazer inflação global. A gente não tem exposição a câmbio, mas nossos fornecedores têm. Particularmente, acho que temos que trabalhar com um cenário muito conservador.

Apesar de que, como tem eleição no ano que vem, várias revisões de incentivos vão beneficiar nosso público consumidor. Tem um pouco de injeção de liquidez que ajuda a gente, como a isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, programas de incentivo e subsídio que chegam para a população mais necessitada.

InfoMoney – E quanto aos efeitos da guerra tarifária?

Franklin – Quando a gente conversa com os fornecedores internacionais, eles veem um mundo menos globalizado com a guerra tarifária, e isso tem em si uma complexidade. Mas, no líquido, o Brasil tende a sair fortalecido, com o agro exportando mais para a China, por exemplo. E o agro sofreu muito no ano passado, o que impacta o nosso crescimento no Centro-Oeste e Norte do Brasil. Se realmente tiver uma melhor, isso nos ajuda. E se a indústria em geral vai vender menos para os Estados Unidos e a Europa, vai priorizar um pouco mais o Brasil.

Agora para o Dia das Mães, por exemplo, estamos fazendo preços melhores do que na Black Friday – e por investimento da indústria.

“Em vez de ser uma briga entre os varejistas, é uma competição entre os fornecedores e novos entrantes chegando no Brasil, querendo pegar uma fatia desse bolo”

A gente consegue negociações melhores, o que ajuda na margem da companhia e em oferecer condições ainda melhores aos clientes. E a escala nos ajuda. Os preços estão bem menores do que imaginávamos que estariam em maio.

InfoMoney – Como vocês vêm conjugando a tradição da marca Casas Bahia com o ambiente de venda digital nesse momento de transformação da companhia?

Franklin – A pandemia trouxe a necessidade de acelerar o digital, e hoje as vendas digitais respondem por 40% da receita da companhia. Nossa marca é “top of mind” há 19 anos consecutivos em eletrodomésticos, mas somos “top of mind” geral no Sudeste – ou seja, quem pensa numa marca, pensa na Casas Bahia. Isso é muito legal porque conseguimos vender tanto para o público triplo A quanto para o brasileiro “normal”, digamos.

No digital, o maior exemplo disso é que lançamos o “carnezinho” digital. Há cidades que não têm nenhuma loja da Casas Bahia, mas as pessoas podem fazer um “carnezinho” no site ou no aplicativo. Isso nos permitiu chegar a 116 milhões de clientes, dos quais 40 milhões nos autorizam a conversar via WhatsApp. Junto com a escala comercial e os descontos que oferecemos, isso nos dá muita força.

“No e-commerce, o mercado ainda não vê crescimento porque estava muito contaminado, é onde estava alocada a receita das categorias de ticket baixo – como água, cerveja, material de limpeza – que desistimos de vender”

Agora vamos começar a mostrar um pouquinho qual é o desafio do digital – que, se você deixar, cresce muito com o parcelamento no cartão sem juros. Como isso machuca a rentabilidade e não é a melhor alocação de capital, prefiro crescer na loja física e no crediário.

InfoMoney – Nas últimas semanas, as ações da Casas Bahia tiveram forte volatilidade, motivada por compras volumosas de investidores como Rafael Ferri e Michael Klein. Como a administração da companhia recebe essas movimentações?

Franklin – Somos passivos nisso. Nosso trabalho é arrumar a operação, a estrutura de capital e entregar resultado na última linha. Uma particularidade nossa é que temos muita pessoa física na base acionária, o que traz uma dinâmica de mercado diferente. Em março, por vários dias, as ações movimentaram mais de R$ 150 milhões. Isso é muito relevante, ninguém montou posição desse tamanho. Essa movimentação é um compra, outro vende, começa boato, vai acontecer isso ou aquilo.

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Outro ponto que traz volatilidade é que como o investidor estrangeiro saiu do Brasil, todo o mercado ficou muito curto. Isso dispara short squeezes com mais frequência, e no mundo inteiro, não só no Brasil. Na companhia, como o desconto está muito grande, acabou sendo percentualmente maior.

Tem discussão de acionistas, e deixamos isso a cargo dos acionistas. Estamos aqui para trabalhar, temos boa relação com todos eles, procuramos manter a transparência e a governança, assegurar que o time de gestão está focado na operação.

Não vejo nenhuma discussão de estratégia. Todos os lados acreditam que o maior crescimento está na loja física e no crediário, que a gente tem que arrumar a estrutura de capital. Todo mundo quer lucro mais do que crescimento. Não vemos nenhum desalinhamento.

InfoMoney – Michael Klein buscou ter uma representação no Conselho de Administração e expressou acreditar que a empresa precisa retomar a rota de crescimento. De alguma maneira, essa discussão trouxe pontos adicionais para a estratégia da gestão?

Franklin – Não tem nenhuma mudança na estratégia da companhia. Nosso foco continua o mesmo. A gente acredita que tem que dar lucro para poder crescer. Temos conversado com os diversos stakeholders e todo mundo está alinhado com essa posição.

A discussão de representatividade pode existir a qualquer momento. Cada acionista tem direito de questionar quem o representa. Aqui, o mesmo acionista é quem aprovou o conselho atual – então, nos fluxos adequados, de acordo com a governança, pode solicitar a revisão. Pode ter discussão, faz parte de qualquer companhia aberta.

InfoMoney – Uma discussão das últimas semanas foi a possibilidade de incluir uma cláusula de poison pill no estatuto da companhia para evitar uma oferta hostil. Por que a ideia foi deixada de lado?

Franklin – A poison pill é uma estrutura para proteger o acionista atual. No caso de uma aquisição hostil, a gente queria criar uma proteção para os acionistas atuais. Mas, de novo, é uma discussão de acionistas, e se eles entendem que não precisa dessa proteção ou que há outros caminhos melhores, a assembleia é soberana.

Houve uma discussão de acionistas, que chegaram à conclusão de que não é momento de fazer poison pill. A companhia fica um pouco mais exposta, do ponto de vista de controle acionário. Não enxergarmos nenhum movimento iminente, mas enquanto administração entendemos que a poison pill é uma boa prática para proteger os minoritários de uma corporation.

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