Juliana Dal Piva, repórter do ICL Notícias e integrante do Centro Latinoamericano de Investigação Jornalística (CLIP, na sigla em espanhol), participou no começo da semana de um evento internacional em Nova York sobre ataques à liberdade de imprensa e ao trabalho jornalístico ao redor do globo. No debate A Luta pela Liberdade de Imprensa Global, organizado pela Escola de Jornalismo da Universidade de Columbia e pelo jornal The New York Times, a brasileira falou sobre os ataques que sofreu durante seu trabalho, especialmente de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Juliana citou o podcast A Vida Secreta de Jair, sobre o envolvimento do ex-presidente e de seus filhos em esquema de desvio de salários de assessores do seu gabinete quando era deputado federal. Ela comentou os ataques que sofreu de Frederick Wassef, advogado da família Bolsonaro, após a publicação do podcast.
“Ele é uma pessoa muito difícil de lidar, para dizer o mínimo, me ameaçou diversas vezes por causa do meu trabalho”, disse Juliana. “Após publicarmos o podcast, ele me escreveu uma mensagem contendo ameaças contra mim. Tornei a ameaça pública e entrei na Justiça contra ele. Mas, antes disso, ele chegou a dizer para mim, durante um telefonema, algo como ‘você se sente muito poderosa aí no prédio em que você trabalha, mas quando está na rua, você é que nem qualquer outra pessoa que pode a qualquer momento levar um tiro na cabeça, porque o Rio de Janeiro é uma cidade muito violenta, e o presidente está trabalhando arduamente contra a violência’. Em outras ocasiões, fez comentários sobre minha aparência, comentários misóginos”.
Em primeira instância, a Justiça chegou a condenar Wassef por danos morais, mas a própria a jornalista também foi condenada por invasão de privacidade, após ter tornado públicas as ameaças do advogado. Em 2023, o Tribunal de Justiça de São Paulo revogou a condenação de Juliana e manteve a de Wassef, de indenizá-la em R$ 10 mil.
No debate, Juliana também comentou de um caso recente, no qual apoiadores de Bolsonaro e pessoas próximas a Wassef começaram a criar narrativas falsas de que ela estaria envolvida em um esquema para incriminar Bolsonaro e colocá-lo na cadeia.
“Eu meio que já aceitei que sempre serei um alvo que eles veem e eles precisam derrubar de alguma forma”, desabafou Juliana. “Existe uma espécie de violência psicológica, quase fiz uma pausa na carreira depois de tudo o que aconteceu. Eu achei que o pior havia passado. Mas nesse último caso, de criar falsas narrativas sobre mim, eu não estava nem trabalhando, eu estava fazendo um curso aqui nos Estados Unidos, e eles inventaram mentiras a meu respeito. Eu acordei um dia e havia milhares de mensagens sobre isso, e fiquei três meses tendo que resolver e lidar com ameaças, comentários misóginos, pessoas dizendo que estavam me observando na rua, coisas do tipo. Demorou um tempo para que eu pudesse recuperar o controle da minha própria vida”.
Quando questionada sobre como combater essas ameaças ao trabalho jornalístico, Juliana destacou a importância de os próprios jornalistas e veículos discutirem questões de segurança e integridade física e mental dos profissionais, antes, durante e depois da cobertura, além de incentivar que os jornalistas processem quem os ameaçou.
“Patrícia Campos Mello, por exemplo, é outra repórter brasileira que também sofreu ataques e foi vítima de comentários misóginos”, disse Juliana. “E quando eu estava sofrendo os ataques que citei, a própria Patrícia, que já havia sofrido ameaças antes, me recomendou levar o caso à Justiça. E isso é algo que nós não estamos costumados a fazer. Os veículos, as empresas, não querem ver seus jornalistas processando fontes. O advogado que citei, um dia, foi uma fonte. Não só para mim, mas para outros repórteres. Então, apesar da solidariedade e carinho que recebi de colegas quando sofri os ataques, existe também este lado, das empresas jornalísticas não quererem ver seus jornalistas processando fontes”.
“Então, é importante pensar nisso, sobre os jornalistas se defenderem judicialmente, processarem quem os ameaçou, mesmo que sejam fontes. Claro que existem injustiças no próprio sistema judiciário, com decisões duvidosas, mas é uma forma de nos defendermos e defendermos o nosso trabalho. E é essencial também discutir a segurança dos jornalistas durante a cobertura, e não apenas antes, ou depois, como uma forma de se preparar para o que pode acontecer”, concluiu Juliana.
Além de Juliana, participaram do debate Aida Alami, professora da universidade James Madison; András Pethő, cofundador e diretor do Direkt36 (Hungria); e Siddharth Varadarajan, fundador e editor do portal de notícias digitais The Wire e ex-editor do The Hindu (Índia). A moderação foi de Sheila Coronel, professora de prática profissional em jornalismo investigativo e diretora do Centro Toni Stabile de Jornalismo Investigativo na Escola de Jornalismo de Columbia.
Assista ao debate completo no YouTube (em inglês).
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