

Ondas de calor, enchentes e queimadas também podem causar estresse, ansiedade e depressão. Os impactos das mudanças climáticas na saúde e na segurança dos trabalhadores são sentidos no corpo e também refletidos pelas estatísticas. Só em Juiz de Fora, houve 2.682 concessões de benefícios previdenciários ligados a questões de saúde mental em 2024, segundo o Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho (SmartLab). O número é recorde da série histórica dos últimos 13 anos e 28% maior do que o total registrado em 2023, quando foram contabilizados 2.089 casos. Em comparação com dez anos atrás, o crescimento deu um salto de 87% no ano passado, já que em 2015 houve 1.433 concessões previdenciárias relacionadas a algum transtorno mental.
Conscientizar a sociedade para a necessidade de enfrentamento dos impactos das mudanças climáticas na saúde e na segurança de trabalhadores é o objetivo das ações desenvolvidas pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) neste Abril Verde, com o tema Futuro Sustentável no Trabalho e no Clima. “No ano passado, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) divulgou que mais de 70% da força de trabalho global do mundo inteiro já está exposta ao risco relacionado às mudanças climáticas, de alguma forma. É obrigação dos empregadores adotar medidas de prevenção e também de mitigação para que esses efeitos não sejam graves para a saúde e segurança do trabalhador”, dispara a vice-coordenadora nacional de Defesa do Meio Ambiente do Trabalho e da Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (Codemat) do MPT, Juliane Mombelli.
Além de questões mentais, câncer, disfunções renais, doenças cardiovasculares e respiratórias também são apontadas pela OIT como os principais problemas em razão das mudanças climáticas. “Não é só excesso de calor, pouca umidade também afeta a saúde”, lembra Juliane. Ela comenta que queimadas e inundações podem causar ansiedade, principalmente para quem convive com a possibilidade de alerta de desastres ambientais relacionados ao seu local de trabalho ou ao seu trajeto. “A pessoa vai conseguir sair? A estrutura predial vai aguentar?”
A convergência entre as alterações no clima e o adoecimento de trabalhadores pode não ser evidente em um primeiro momento. Mas, com exemplificações, a procuradora do MPT torna mais próxima essa lógica: Câncer pode estar diretamente ligado ao uso dos agrotóxicos, porque as mudanças climáticas afetam a agricultura, então muitas vezes é necessário usar mais química em determinada cultura. Como isso, o trabalhador fica mais exposto ao produto e, se ele não estiver protegido, pode ser afetado. Doenças renais podem ser causadas pela falta de hidratação, enquanto as pulmonares, pela baixa umidade do ar. Já as cardiovasculares, decorrem de uma conjunção de fatores.
Desde 2022, foram instaurados na Procuradoria do Trabalho de Juiz de Fora 102 procedimentos com os temas acidentes de trabalho e doenças profissionais ou do trabalho, dos quais 43 estão ativos. O Abril Verde é marcado pelo Dia Mundial da Segurança e da Saúde no Trabalho e pelo Dia Nacional em Memória das Vítimas de Acidentes e Doenças do Trabalho, celebrados em 28 de abril.
Denúncias por exposição ocupacional ao calor disparam

Com as temperaturas cada vez mais elevadas, as denúncias por exposição ocupacional ao calor dispararam neste ano. Nos 12 meses de 2024, o MPT recebeu, em todo o país, 817 comunicados, enquanto, de janeiro a março deste ano, houve 463 reclamações. “Em três meses, recebemos mais da metade das denúncias do ano passado”, reflete a vice-coordenadora nacional de Defesa do Meio Ambiente do Trabalho e da Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (Codemat) do MPT, Juliane Mombelli.
Segundo ela, no ano passado foram recebidas pelo MPT 398 denúncias sobre situações de emergência e calamidade nacional. Em meio a queimadas, enchentes, desabamentos e ondas de calor, a procuradora cita casos de bombeiros combatendo incêndio sem EPI e de colaboradores em fábrica inundada, com risco de contrair doenças e de tudo desabar. “Quando há acidente ampliado, quem sofre primeiro são os trabalhadores envolvidos”, aponta a procuradora do MPT, acrescentando que o maior acidente de trabalho no Brasil em perda de vidas humanas foi o rompimento da barragem em Brumadinho (MG), ocorrido em janeiro de 2019, deixando mais de 270 mortos.
De olho nos impactos das mudanças climáticas na saúde e segurança do trabalhador, o MPT criou um grupo para estudar situações reais e produzir um documento com diretrizes de atuação. “Praticamente diz aos empregadores coisas que têm que prever e se preparar, desde acompanhar volumes de precipitações e ondas de calor”, detalha Juliane. O relatório propõe medidas, que podem ser desde administrativas, como mudar o horário de trabalho: se for ao ar livre, laborar cedo ou no final da tarde, por exemplo. Programas de saúde e gerenciamento de risco integram a proposta. Fazer concessões conforme cada caso, ofertar momentos de pausa, dar orientações e fornecer hidratação para os trabalhadores estão entre as medidas recomendadas.
Com o aquecimento global, profissões exercidas ao ar livre exigem mais cuidado, já que as pessoas ficam expostas ao sol. Mas quem precisa usar terno fechado também sofre, como seguranças de shopping, lembra a procuradora. “As medidas têm que ser pensadas primeiro no aspecto coletivo dos trabalhadores e, depois, individualmente, se não surtirem efeito”, destaca. “Cada empregador vai identificar qual a melhor medida para o seu ambiente de trabalho”. Fornecer EPIs, permitir o teletrabalho em casos necessários, como de gravidez, são algumas ideias. “Existe uma norma que fala de conforto térmico no ambiente, que pode ser feito por ar condicionado, ventilador ou exaustor”, complementa.
A procuradora enfatiza que as medidas de proteção são obrigatórias para todos que contratam serviços, e não só para trabalhadores CLT. “O Poder Público que contrata pessoas para atuar na rua também tem que proteger o trabalhador. O direito ao meio ambiente de trabalho seguro é considerado como direito humano fundamental.”
Precarização das relações de trabalho afeta a saúde
Questionada sobre os motivos que levaram à elevação dos afastamentos por saúde mental, Juliane Mombelli avalia que, além dos impactos pelas mudanças climáticas, há uma precarização das relações de trabalho desde 2017, com a reforma trabalhista, que teria contribuído para o crescimento exponencial deste tipo de adoecimento em todo o país. A pejotização, ao invés da CLT, deixa trabalhadores em situação de vulnerabilidade. Além disso, muitas pessoas não conseguem ter uma vida digna em razão dos baixos salários. Falta de perspectiva do futuro, cobranças e metas abusivas, excesso de horas extras, não saber quando vai poder tirar férias e se vai ter trabalho no mês seguinte são algumas situações que causam ansiedade. Problemas de assédio moral ou sexual e de violência no trabalho também engrossam a lista.
“Não basta prever ações de atenção à saúde, como oferecer apoio psicológico”, alerta Juliane. Segundo ela, a relação de doenças ligadas ao trabalho foi atualizada em novembro de 2023 e incluiu o burnout, também conhecido como síndrome do esgotamento profissional. “Todas as empresas têm que identificar fatores de risco psicossocial social que possam atingir a saúde dos trabalhadores”, conclui.
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