Há 30 anos, Reserva Heitor produz café especial enquanto sequestra carbono

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Reserva Heitor produz café de fruto amarelo e trabalha com técnicas de sustentabilidade (Foto: Arquivo pessoal)

Quando Sheyla e Marcus compraram a propriedade rural onde fica a Reserva Heitor, toda a área era de pasto. Foi preciso um trabalho consciente para recuperar as terras e até fazer com que a água pudesse ser utilizada no local para a produção de café. Só anos depois entenderam que aquilo que precisaram fazer eram medidas de sustentabilidade, que conquistariam mais recentemente um nicho de mercado próprio. Essa é uma das fazendas que faz parte da Rota de Café do Cerrado Mineiro, em Patos de Minas, e que chama a atenção há 30 anos pelas medidas de preservação e trabalho social na região, além do sequestro de carbono, feito inédito em todo o país. O resultado de todo esse cuidado é um café especial, que traz as características específicas da região a partir de notas de caramelo, cana e chocolate. A Tribuna esteve no local e pôde conferir isso de perto.

Os cafés são classificados, no Brasil, entre tradicional, superior, gourmet e especial, sendo o último o café com menos “defeitos” e um sabor mais refinado. É justamente esse produto que eles se dedicam a fazer e, para isso, contam com uma equipe que tenta entender as características do solo e da plantação mais propícias a alcançar essa qualidade. Marina Rosa, gerente administrativa da Reserva Heitor, já está acostumada com esse trabalho. “A gente usa o plantio de mix de coberturas, em que colocamos plantas no meio da rua do café. Buscamos deixar o solo coberto a maior parte do tempo, para diminuir os impactos das mudanças climáticas. Além de conseguir manter a umidade, diminuímos a temperatura do solo”, explica. Boa parte dessas medidas já eram feitas por Sheyla, que aprendeu o plantio com o pai, conhecimento especializado ao longo do tempo – ainda mais quando os filhos, Leonardo e Mariana, também entram no negócio familiar.

A plantação de café com fruto amarelo da reserva é claramente diferente das outras plantações da região, em que é possível ver apenas o café, em um estilo de monocultura. No caso deles, em todas as fileiras de plantação do café há plantações intercaladas. “As raízes de diferentes plantas ajudam na compactação e na microbiota desses solos, atraindo diferentes fungos e também os insetos para as flores”, entende Marina. Outro diferencial para a sustentabilidade no local é o uso da compostagem produzida dentro da fazenda, aproveitando os resíduos deixados pela palha do café e a água do lavadouro. “Também usamos esterco de gado, de confinamento, de um vizinho. Fazemos essa compostagem e usamos desde 2019, e ainda acrescentamos algum nutriente ou correção para a planta”, conta.

A característica da Reserva Heitor é ter o que chamam de café novo, com seis anos de vida. “Conseguimos ter cafés com variedades mais novas e tecnológicas, que são resistentes a pragas e que diminuem o uso de químico”, explica Marina. Para Leonardo, o mais inovador em todo esse processo é o que fazem de sequestro de carbono, que consegue “limpar” 40 quilos por hectare ao ano, sendo a primeira fazenda que consegue fazer isso no país. “A gente só foi ter noção disso quando vimos que o segundo lugar ainda emitia toneladas de Co2 ao ano”, relembra. Atualmente, eles produzem 52 sacas por hectare e, além do café tradicional, também produzem uma variedade cítrica, que conta com notas de manga, carambola, laranja e limão.

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Marina Rosa explica que reserva sentiu os efeitos das mudanças climáticas, e busca medidas para amenizar situação (Foto: Nelson de Almeida)

Minimizando efeitos das mudanças climáticas

A sustentabilidade passou a ser uma preocupação ainda maior nos últimos anos, que também trouxeram novos desafios para o ambiente rural com as mudanças climáticas, que foram percebidas por todos da fazenda. “Temos tido menos chuvas e chuvas em períodos nos quais a gente não estava acostumado a ter. E muito calor. No ano passado, tivemos altas temperaturas em época de florada do café, e a chuva demorou muito a vir. Então tivemos alguns impactos de queda de produção”, explica Marina. O que tem acontecido, por exemplo, é que o café flore bem, mas, por causa do calor excessivo, acaba abortando uma parte dessas flores, que depois não vingam. “A fazenda é uma indústria a céu aberto. A gente entende que essas práticas de sustentabilidade conseguem minimizar os efeitos das mudanças climáticas. Mas essas diferenças tão grandes no tempo de um ano para outro acabam dificultando bastante”, afirma.

O café no local é irrigado, mas como observa Leonardo, a irrigação não consegue resolver tudo. “A gente associa alta temperatura com colocar mais água, mas calor é uma coisa e umidade é outra. A partir de uma certa temperatura, o café para de metabolizar. Ele para de produzir novas flores e frutos”, explica ele. Esse foco, então, passou a ser uma necessidade maior.

Os trabalhos realizados por eles foram reconhecidos com o Prêmio Sicoob, Primeiro Lugar Sou Rural Sustentável e prêmio Globo Rural de sustentabilidade.

‘A gente planta água’

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Cafés especiais produzidos no local possuem notas cítricas ou adocicadas (Foto: Nelson de Almeida)

A sustentabilidade não é a única bandeira da Reserva Heitor. Eles também acreditam que, para que essas ações tenham continuidade e repercutam em efeitos maiores, é preciso trabalhar com a comunidade local e gerar impactos na sociedade. Um dos trabalhos que realizam, nesse sentido, é o “Dia da Árvore”, em que recebem crianças e adolescentes de escolas públicas da região para ensinar sobre preservação ao meio ambiente e plantar árvores. Na primeira turma que receberam, inclusive, estava Marina – ela continuou sua capacitação a partir do encontro e atualmente trabalha com eles.

O que fazem na Reserva Heitor foi dito para eles, inclusive, que não era possível. O caso clássico é o da água, que pode ser vista em uma das trilhas que percorrem com os visitantes, a partir de uma nascente. Apesar de as pessoas afirmarem que lá não havia fonte, Sheyla viu que existia sinal dessa água, com umidade, e fez o trabalho de recuperação na terra para que fosse possível ter acesso. Desde então, muita coisa foi mudando assim também. “A água veio e nunca faltou. A gente roda toda a fazenda com ela, é nosso consumo. Brincamos que a gente planta água”, diz.

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