Sakamoto: Com Trump, Big Techs podem enfraquecer democracia sob uma chuva de likes

Mark Zuckerberg (Meta), Jeff Bezos (Amazon), Sundar Pichai (Google) e Elon Musk (X) presentes na cerimônia de posse de Donald Trump – Foto: Julia Demaree Nikhinson/via REUTERS

Por Leonardo Sakamoto, no UOL

Os homens que decidem como escolhemos (Sergey Brin e Sundar Pichai, do Google e do YouTube), o que consumimos (Elon Musk, do X, Mark Zuckerberg, do Facebook, Instagram, Threads e WhatsApp, e Shou Zi Chew, do TikTok), o que compramos (Jeff Bezos, da Amazon), como nos comunicamos (Tim Cook, da Apple) e o que comunicamos (Sam Altman, do ChatGPT) estavam na posse de Trump. A maioria deles estava mais bem localizada na cerimônia no Capitólio do que membros do próprio gabinete do novo presidente. Faz sentido porque, afinal de contas, era a inauguração de um governo de bilionários para bilionários.

Não se engane: apesar das promessas voltadas à classe trabalhadora, os maiores beneficiados vão ser alguns dos homens mais ricos da face da Terra. Com desregulação, com corte de impostos para milionários, com o uso do Estado para defender interesses privados dentro e fora do território norte-americano.

“Quando comecei a falar sobre oligarquia, muitas pessoas não entenderam o que quis dizer. Bem, isso mudou. Quando os três homens mais ricos na América [Musk, Bezos e Zuckerberg] sentam-se atrás de Trump em sua posse, todos entendem que a classe dos bilionários agora controla nosso governo”, postou o senador democrata Bernie Sanders.

Mas a questão vai muito além dos interesses defendidos pelo Tio Sam. Nas últimas semanas, assistimos donos e comandantes de Big Techs fazerem juras de amor à nova gestão, alguns por razões ideológicas, outros de forma descaradamente oportunista.

Cavam uma trincheira nos Estados Unidos para lutar contra a aspiração por regulação (ou seja, a garantia que as leis offline também sejam respeitadas no mundo online) que vem sendo debatida pelo mundo, por exemplo na União Europeia, na Austrália e no Brasil.

E, a partir daí, influenciar mudanças políticas anti-regulatórias que os impeçam de gastar dinheiro adaptando suas plataformas às necessidades de cada país. Incentivando a ascensão da extrema direita na Alemanha, por exemplo, como faz Musk.

Durante anos, as empresas defenderam que suas plataformas representavam arenas públicas onde o debate ocorre livremente e de forma equilibrada. Recente anúncio de Mark Zuckerberg levantou, inclusive, essa bandeira, dizendo que iria ampliar a liberdade de expressão em suas redes. Que isso esteja ocorrendo em detrimento a outros direitos, como a dignidade e colocando em risco grupos minoritários em direitos, é apenas um detalhe.

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump – Foto: Reprodução

O relacionamento estreito das plataformas com o governo Trump aponta para um problema para a democracia, pois pode atender à vontade de um homem e seu grupo. É possível acreditar no mito da neutralidade desses espaços de debate público e, portanto, de construção e reconstrução da realidade, quando Musk usou a força de sua conta no X para eleger o novo presidente? Ou quando Zuckerberg adota o mesmo formato de discurso da extrema direita para anunciar as mudanças?

O temor para o mundo é que esse grupo que prestigiou a posse acabe atuando para as necessidades do governo de plantão. Não apenas como um Ministério da Verdade, como o do romance “1984”, de George Orwell, afinal as Big Techs vão muito além do que se imaginou para o Big Brother – o do livro de Orwell, não o do reality. A vigilância constante através delas já existe há tempos, o que avança é a sua capacidade de modelar desejos, opiniões e comportamentos.

A humanidade vai ter que ficar de olho no comportamento das Big Techs durante os próximos quatro anos. Trump é apenas um instrumento para as empresas, a questão é o mundo que ele vai ajudar a criar para elas. E, devido à sua idade avançada, talvez nem mesmo veja todos resultados de sua distopia digital.

Nunca a regulação foi tão importante, nunca um tratado global, tão necessário.

Redes com poucas regras não são redes mais livres, mas um espaço em que o ódio e a intolerância têm mais caminho para correr. Ao mesmo tempo, redes em que as regras favorecem o mandatário e permite que fatos sejam manipulados em nome de um bom negócio não são redes, mas correntes.

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