Juiz absolve estudante de acusação de injúria racial e diz que condenação atrapalharia seu futuro

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Uma estudante de administração de empresas de 22 anos foi absolvida pela Justiça de uma acusação de injúria racial contra três seguranças negras. O caso aconteceu durante uma festa universitária em São Paulo.

Na decisão, o juiz Carlos Eduardo Lora Franco, da 3ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, afirmou não haver dúvidas sobre as ofensas racistas praticadas. Porém, argumentou que a ré estava sob perturbação mental, já que havia consumido álcool e maconha, e que a condenação seria desproporcional. Ressaltou que ela estuda em uma universidade de ponta e que a condenação comprometeria seu futuro.

A absolvição ocorreu em 11 de novembro de 2024.

A Promotoria recorreu da decisão. O órgão afirmou que a sentença transmite um recado de que pessoas ricas podem sair impunes porque frequentam espaços de privilégio.

Segundo o processo, a estudante estava em uma festa no estádio do Canindé em 24 de setembro de 2022, quando, alterada, passou a agredir outros participantes.

Ela participou de dois momentos de confusão. O primeiro, no camarote, teria ocorrido quando ela agrediu algumas pessoas. As seguranças conversaram com a ré, que afirmou que o episódio não se repetiria.

O segundo, que culminou em sua expulsão do local, teria se dado em razão de um suposto assédio sofrido por ela. A estudante teria agredido o homem. As seguranças foram chamadas.

De acordo com o relato das vítimas no processo, ao ser expulsa, ela mordeu a mão de uma das seguranças e ofendeu as três com expressões como: “preta suja, fedida, macaca, eu tenho nojo de vocês, vadia, puta”.

A ré afirmou no processo que não se lembra do que aconteceu, mas tem certeza de que não fez ofensas racistas.

Ela também disse que não se considera racista porque desde pequena anda de skate, gosta de todas as pessoas e, recentemente, se assumiu bissexual. Afirmou, também, que tem amigos negros e caiçaras.

O juiz Carlos Eduardo Lora Franco destacou que uma pessoa “sob efeito severo de álcool e drogas”, sendo levada para fora da festa, ficaria nervosa e revoltada.

Franco afirmou que o estado da ré não legitima qualquer conduta e que a ofensa não se justifica, mas são menos graves e menos ofensivas do que se fosse praticada por alguém que estivesse equilibrado.

O juiz afirmou que o comportamento do Ministério Público é “desproporcionalmente severo e intransigente”. Para ele, deveria ter sido celebrado um acordo de não persecução penal, ainda que com imposição de prestação de serviços à comunidade e mesmo indenização às vítimas.

A ré chegou a oferecer R$ 500 à segurança que teve a mão mordida, mas a vítima não aceitou.

Ainda no processo, consta que a ré foi diagnosticada com borderline, transtorno depressivo recorrente e transtornos mentais por uso de maconha. O laudo é de 23 de setembro de 2024.

Para o juiz, a postura da Promotoria impõe seríssimas consequências para toda a vida da ré.

“De fato, sendo a vítima estudante universitária de administração de empresas, de uma das melhores faculdades do país, sem dúvida alguma de que a mera existência de uma condenação criminal por delito desta natureza irá implicar em enormes e, muito provavelmente, intransponíveis obstáculos à sua carreira, já que difícil crer que qualquer grande empresa irá contratar alguém que já tenha sido condenado por este delito específico, sobretudo nos termos atuais tão rígidos quanto a isso, ante as politicas de ESG”, afirmou o juiz.

“Assim, por questão de justiça, adequação e proporção, tenho que não resta outra solução que não a absolvição da ré”, decidiu ele.

A defesa argumentou que a mulher tem problemas psicológicos. “Ela não tem memória do fato. Inclusive, é muito triste, porque não tem nada a ver com o comportamento dela. É uma moça que tem uma atividade no skate, é uma moça da diversidade”, afirmou Antônio Sérgio Pitombo, um dos advogados da estudante.

Ele também criticou a Promotoria. “O Ministério Público foi muito negligente em relação à coleta de provas. A gente pediu para que fossem trazidos para os autos os vídeos do local, e o Ministério Público achou a prova desnecessária”, concluiu o advogado.

O promotor Danilo Keiti Goto, do Gecradi (Grupo Especial de Combate aos Crimes Raciais e de Intolerância), afirmou que as provas são claras e que, diante delas, a Promotoria entendeu que as imagens do local não eram necessárias.

Também afirmou que não foram apresentadas provas de que a ré foi vítima de agressão ou violência sexual.

“Na prática [a decisão], autoriza o racismo daquele que faz uso de qualquer substância. A prova nos autos é contundente no sentido de que, no momento dos fatos, a acusada não só se embriagou de forma voluntária como estava lúcida quando cometeu os crimes”, afirmou.

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