Músico de Barbacena, Fernando Pellon terá sua história contada em documentário

fernando pellon

Fernando Pellon
Dinâmica de lançamento de ‘Cadáver pega fogo durante o velório’ e toda sua história são contadas no documentário (Foto: Divulgação)

Em 1983, nasceu o álbum “Cadáver pega fogo durante o velório”, do compositor mineiro Fernando Pellon, de Barbacena. Como na gestação, o álbum demorou nove meses para ser lançado, em razão da censura de algumas músicas pela ditadura. O trabalho veio ao mundo, mas apareceu por pouco tempo. Foi enterrado na memória dos brasileiros, até ser redescoberto na internet e ganhar o status de clássico brasileiro. Toda essa história será contada em documentário, ainda sem nome, dirigido por Fabio Giorgio, com previsão de término das gravações no segundo semestre deste ano. O produto ainda não tem data de lançamento, mas a previsão é que ele aconteça ainda neste ano.

A ideia da concepção do álbum “Cadáver pega fogo durante o velório” se dá, em certo sentido, por causa de Torquato Neto. De acordo com o poeta, em “Os últimos dias de pauperia”, cada brasileiro deve registrar a realidade brasileira a partir de seu ponto de vista. Depois, com esses vários “filminhos”, é possível traçar os planos gerais de um cenário. Pellon acredita que seu álbum é sua forma de contribuir para quem desejar montar este quadro geral. Na capa do disco é possível ver isso. O recorte de manchetes para construir sua perspectiva da realidade brasileira está tanto no nome como nas diversas outras manchetes que compõem o projeto gráfico.

Nela, ainda estão presentes letras de samba que servem como comentários das notícias, além das fotos de membros do grupo Malta de Areia – coletivo do qual Pellon fez parte – e nos cartazes de procurados pela ditadura militar. Essa visualidade foi um dos motivos pela redescoberta do álbum nos tempos de Orkut (extinta rede social), enquanto as temáticas e sonoridade alçaram o disco ao patamar de clássico brasileiro, ao menos no underground.

Pellon define que o disco é permeado pelo “crepúsculo do patriarca”, protagonista que, de acordo com ele, vai apodrecendo tal qual esse sistema social. Sua atemporalidade e conexão com a juventude decorre da não melhora da sociedade no que diz respeito à aceitação das mulheres no mercado de trabalho e ao machismo, à dificuldade em discutir gênero, ao racismo, à aporofobia, além de diversos outros fatores. “Voltamos a repetir questões que não conseguimos dar soluções”, afirma o músico.

fernando pellon cadaver pega fogo
(Foto: Reprodução)

O ouvinte é convidado pela capa do disco a abrir o que seria um jornal, em que diversas atrocidades são narradas ao som de sambas e ritmos pré-bossa nova, com algumas ironias. Por mais que Pellon e o coletivo Malta de Areia soubessem do desconforto que o trabalho causaria, seguiram em frente. Isso rendeu a premiação de um dos dez melhores álbuns independentes de 1983. Por outro lado, não conseguiram fechar shows e tiveram três músicas censuradas.

Mesmo conseguindo liberar duas das três canções, porém, “Com todas as letras” teve de chegar à última instância de seu respectivo trâmite para ser liberada. Por isso o “Cadáver pega fogo durante o velório” foi uma gestação: em março foi lançado, sendo liberado somente em dezembro, para ser lançado em janeiro de 1984.

O documentário sobre Fernando Pellon

fernando pellon
Fabio Giorgio, diretor do projeto audiovisual, afirma que, para dar conta do que se investiga, ‘não está para vir um produto audiovisual convencional’ (Foto: Aline Greco/ Divulgação)

O processo de compilar essas e várias outras histórias que permeiam a trajetória de Pellon, o coletivo Malta de Areia e o disco, ficou a cargo de Fabio Giorgio, que também foi responsável por viabilizar, em 2018, o show do álbum no Sesc Belenzinho. Seu primeiro contato com o “Cadáver pega fogo durante o velório” se deu em um show, no final da década de 1980, quando ouviu a música “Carne no jantar”. Entretanto, foi em 1992, após localizar o disco no acervo da USP-FM, que foi fisgado. Primeiro pela ousadia temática e depois pelo viés sociopolítico manifestado na obra.

“De forma aberta, exógena, há a onipresença da morte com alguns propósitos: contextualizar a banalização da vida, a restrição das liberdades individuais, a instituição da censura, os subsequentes crimes de Estado praticados pela ditadura empresarial-civil-militar de 1964, o drama humano em perspectiva, as mazelas de ontem e hoje. Ou seja, há uma flagrante denúncia àquele estado de coisas no álbum de estreia de Fernando Pellon que permanece atual, assim como o estado de coisas”, afirma o diretor.

O projeto, além de revisitar o álbum, busca trabalhar as diferentes facetas de Pellon, que trabalha como geólogo e pesquisador na Petrobras. Esses outros trabalhos, no entendimento do próprio Pellon, se integram no ponto de que em ambos os ofícios ele busca “questionar os paradigmas vigentes”. Na pesquisa, buscando novas tecnologias, enquanto na arte, buscando novas formas de fazer música popular brasileira.

No documentário estará presente também um pouco da história da Malta de Areia. “Foi um coletivo de compositores sediado em Niterói, de curta duração, mas muito intensa, com poucas produções. Além do álbum do Pellon, com participação de alguns integrantes dele, destaco o curta ficcional ‘É Miquelina, minha mulher’, da Fátima Lannes, inspirado na composição ‘Flores de plástico ao amanhecer’, parceria do Pellon com o Renato Costa Lima. Estou tentando reunir os parcos registros e documentos existentes que aferem seus feitos e propósitos”, explica Fabio.

Para narrar estas múltiplas facetas, o diretor destaca que “não está para vir um produto audiovisual convencional”. Ainda em fase de produção, Fabio busca finalizar a obra no segundo semestre de 2025.

*Estagiário sob supervisão da editora Cecília Itaborahy

 

O post Músico de Barbacena, Fernando Pellon terá sua história contada em documentário apareceu primeiro em Tribuna de Minas.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.