Três grupos na ‘doideira’ de Bolsonaro: conheça os golpistas da primeira delação de Mauro Cid

Jair Bolsonaro e Mauro Cid em março de 2020 — Foto: Alan Santos/PR

O tenente-coronel Mauro Cid, chefe da Ajudância de Ordens de Jair Bolsonaro (PL), revelou em sua colaboração premiada detalhes alarmantes sobre os grupos que orbitavam o ex-presidente após a vitória de Lula. Os depoimentos, mantidos sob sigilo pelo ministro Alexandre de Moraes, começaram a ser prestados em agosto de 2023. O primeiro, de 28 de agosto, obtido pelo colunista Elio Gaspari, da Folha, possui seis páginas e menciona mais de 20 pessoas, expondo a existência de uma ala radical que articulava um golpe de Estado.

Os três grupos ao redor de Bolsonaro

Segundo Cid, após o segundo turno de 2022, três grupos influenciavam Bolsonaro:

  1. O grupo moderado pró-aceitação: Este grupo incentivava Bolsonaro a aceitar a derrota e se tornar “o grande líder da oposição”. Entre seus integrantes estavam o senador Flávio Bolsonaro, o chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, o advogado-geral da União, Bruno Bianco, e o brigadeiro Baptista Júnior, comandante da Força Aérea.
  2. O grupo contrário ao golpe: Ainda mais moderado, defendia que não havia o que fazer diante do resultado eleitoral, temendo que um golpe militar resultasse em um regime autoritário por décadas. Este grupo incluía os generais Freire Gomes (comandante do Exército), Paulo Sérgio Nogueira (ministro da Defesa) e Júlio César de Arruda. Havia ainda figuras como o empresário Paulo Junqueira, que financiou a ida de Bolsonaro aos Estados Unidos.
  3. O grupo radical pró-golpe: Dividia-se em duas alas. Uma buscava provas de fraude eleitoral, envolvendo nomes como o major da reserva Angelo Denicoli e o senador Carlos Heinze, que chegou a propor o sequestro de uma urna eletrônica para testes. A outra ala defendia um “braço armado” e articulava a assinatura de um decreto golpista.

A gestação do golpe e os bastidores do “documento do Alvorada”

Após o segundo turno, Filipe Martins, assessor internacional de Bolsonaro, levou um jurista (não identificado) ao ex-presidente. Isso resultou em um documento que previa a prisão de figuras como Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes e Rodrigo Pacheco, e anulava o resultado eleitoral. Bolsonaro recebeu diversas versões da minuta, ajustando-a ao longo do tempo.

Em 2 de novembro de 2022, Bolsonaro apresentou o documento aos comandantes militares em uma reunião no Palácio da Alvorada. Mauro Cid, responsável pela apresentação em PowerPoint, não participou da conversa, mas ouviu os relatos posteriores:

  • Almirante Garnier (Marinha): Defendia a intervenção militar, mas condicionava a ação à adesão do Exército.
  • Brigadeiro Baptista Júnior (Força Aérea): Rejeitou categoricamente qualquer tentativa de golpe e reafirmou que não houve fraude nas eleições.
  • General Freire Gomes (Exército): Adotou uma posição intermediária, mas descartou o golpe, destacando que as instituições estavam funcionando e não havia provas de fraude.

Sem o apoio das Forças Armadas, Bolsonaro hesitou em avançar. Ainda assim, trabalhou em duas frentes: encontrar evidências de fraude ou convencer as Forças Armadas a apoiar um golpe.

Os nomes da ala mais radical

Cid revelou que a ala mais radical incluía figuras como Onyx Lorenzoni, Jorge Seif, Gilson Machado, Magno Malta, Eduardo Bolsonaro e o general Mário Fernandes, este último atuando ostensivamente para angariar apoio entre militares. Além disso, a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro também foi mencionada como integrante do grupo radical.

O ministro Alexandre de Moraes tomou conhecimento das informações em agosto de 2023 e, desde então, Cid voltou a depor mais de dez vezes. As revelações lançam luz sobre as tentativas golpistas e fortalecem a investigação em curso, conduzida pela Polícia Federal e pelo Supremo Tribunal Federal.

Esses depoimentos não apenas detalham as articulações golpistas, mas também revelam as divisões internas no entorno de Bolsonaro, marcando um dos capítulos mais sombrios da história recente da democracia brasileira.

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