Dia Nacional de Combate e Prevenção à Hanseníase: entenda doença estigmatizada, mas que tem cura

Dia Nacional de Combate e Prevenção à Hanseníase

Dia Nacional de Combate e Prevenção à Hanseníase
Casos de hanseníase são diagnosticados por meio do exame físico geral dermatológico e neurológico para identificar lesões ou áreas de pele com alteração de sensibilidade e/ou comprometimento de nervos periféricos, com alterações sensitivas e/ou motoras e/ou autonômicas (Foto: Leonardo Costa)

O Dia Nacional de Combate e Prevenção à Hanseníase, lembrado no último domingo do Janeiro Roxo, mês de enfrentamento à doença, tem como objetivo trazer conhecimento sobre uma condição ainda estigmatizada. Em um passado pouco distante, pessoas que apresentavam os sintomas da doença, à época chama de “lepra”, eram isoladas da vida em sociedade, tinham seus filhos retirados da vida familiar e não recebiam nenhum tipo de cuidado. Mas muito mudou, desde então: atualmente, a hanseníase pode ser tratada gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e tem cura. Entre 2022 e 2024, foram diagnosticados, em média, 1.339 novos casos da hanseníase por ano em Minas Gerais, de acordo com dados do Estado. Os números apontam que ainda há transmissão ativa. O Brasil também segue em segundo lugar no ranking mundial no número de casos. Por isso, os especialistas reforçam a necessidade de conhecimento acerca da doença, para que os primeiros sinais possam ser identificados e o diagnóstico precoce evite complicações.

O Hospital Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora (HU-UFJF), vinculado à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), oferece o tratamento na unidade Dom Bosco, toda quarta-feira, no período da manhã. Como explica a dermatologista Annair do Valle, a doença infectocontagiosa é causada pela bactéria Mycobacterium leprae. A transmissão acontece principalmente pelo contato com as vias aéreas superiores, mas, ao contrário do que muitas pessoas pensam, somente nos casos em que o contato é íntimo e prolongado. Não é cumprimentar o paciente e pegar a doença. (…) Chamamos de uma doença de cama e mesa, em que tem que dormir com a pessoa, acordar com a pessoa, comer com a pessoa”, explica a médica do HU-UFJF.

Um dos pacientes tratados no local, R.O., de 56 anos, que prefere não ser identificado na matéria, descobriu a doença ao apresentar pequenas manchas nas extremidades do corpo, como no cotovelo e na orelha, que, como a médica explica, são alguns dos sintomas mais comuns. Ele nunca tinha ouvido falar de hanseníase, até então. “Quando me contaram, falaram que tinha tratamento e cura, foi isso que me tranquilizou”, conta ele. Apesar do paciente ter feito tratamento e chegado à cura há cerca de cinco anos, por se tratar de uma doença crônica, a condição voltou a aparecer em seu corpo. Ele, então, faz o tratamento pela segunda vez. No caso de R.O., assim como acontece com muitas pessoas, foi preciso também testar a sua esposa – no entanto, ela não foi diagnosticada com a hanseníase. Isso acontece porque, como explica a médica, cerca de 90% da população já desenvolveu resistência natural à doença

Mas é preciso lembrar que a hanseníase existe. Entre os 10% que podem entrar em contato com a bactéria e desenvolver a doença, parte pode ter danos neurológicos significativos e uma perda grande da qualidade de vida. “A hanseníase é uma doença de saúde pública, tem que ser mais pesquisada, tem que investir no combate e fazer o país acordar”, destaca Annair. Para ela, um dos maiores desafios para combater a doença é o tempo de manifestação dos sintomas, pois o tempo de incubação da bactéria é muito variável e os primeiros sintomas podem aparecer de 5 a 7 anos depois do contato, dificultando o controle do contágio.

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Annair do Valle, dermatologista do HU-UFJF, destaca a importância de o paciente estar atento aos primeiros sintomas da doença (Foto: Leonardo Costa)

Estigmatização e preconceito

O tratamento para hanseníase é feito com poliquimioterapia única (PQT-U), associando os fármacos rifampicina, dapsona e clofazimina, e podendo ter tempo de duração de seis meses a um ano. No entanto, como explica a especialista, um dos maiores desafios para os pacientes da hanseníase é a “cura social”. Isso porque, se há séculos atrás as pessoas eram isoladas, ainda hoje a doença é cercada de preconceitos: tanto quanto à higiene dos infectados ou quanto à possibilidade de contágio, assuntos que, como a médica esclarece, são repletos de desinformação. A higiene, afinal, não é relacionada com o contágio da bactéria, e a transmissão acontece em situações específicas, como as já citadas.

Mas, considerando o histórico da doença, ainda há muitos desafios. Um deles inclusive é ligado à religião, já que na Bíblia, a chamada lepra era considerada um castigo de Deus – essa crença, ainda disseminada, afeta a saúde mental e a autoestima dos pacientes. “O relato de muitos deles é de depressão, ansiedade e culpa. Acham que ter hanseníase é uma punição por algo que fez na vida. A cabeça do paciente fica muito mal. Já escutei relatos de pacientes falando em se matar”, conta. Por isso, ela também destaca a importância de uma equipe multidisciplinar durante o tratamento, com ajuda de psicólogo e fisioterapeuta, para que todas as sequelas sejam tratadas.

Importância do diagnóstico precoce da hanseníase 

A identificação da doença desde os primeiros sinais é essencial para que o combate à hanseníase aconteça. “O diagnóstico precoce evita as sequelas neurológicas. Se não trata, o paciente pode ficar com prejuízo motor. Isso acontece quando a pessoa não consegue segurar nada ou andar, e não consegue segurar o chinelo no pé”, explica a médica. Ela alerta, por exemplo, os casos em que as manchas são acompanhadas de alteração de sensibilidade. “Pode ser uma hiperestesia ou leve anestesia, principalmente da parte térmica. A dona de casa, por exemplo, chama a atenção quando se queima sem sentir”, conta.

Para ela, ainda, é essencial a capacitação dos profissionais de saúde para identificarem a doença, pois muitos não estão acostumados a se lembrar que, dentre as questões de pele, essa pode ser uma possibilidade. “A gente precisa capacitar melhor os profissionais da área de saúde, os médicos de consultório. Precisamos lembrar que existe a hanseníase, para que as pessoas façam o encaminhamento correto e a gente cerque o desenvolvimento da doença”, afirma.

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